Símbolo da resistência, Domingos Fernandes relembra Marighella no combate à ditadura


Por Bruno Ribeiro/FLB-AP
02/12/2020

O Centro de Memória Trabalhista (CMT) lançou, nesta quarta-feira (2), a entrevista inédita e exclusiva com Domingos Fernandes, signatário da Carta de Lisboa ao lado de Leonel Brizola, em 1979, durante o exílio gerado pelo enfrentamento do regime militar brasileiro. Pelo podcast ‘A Voz Trabalhista’, a divulgação ocorreu, de forma antecipada, em homenagem póstuma ao economista, que faleceu nessa terça-feira (1), em São Paulo, aos 74 anos.

Gravado em novembro deste ano, o diálogo foi uma das últimas manifestações públicas do histórico trabalhista e membro do Grupo dos 11 e da Ação Libertadora Nacional (ALN), vinculada a Carlos Marighella. Em sua fala, o carioca reafirmou seu posicionamento incisivo sobre seu alistamento no Exército, a luta armada e o enfrentamento da ditadura militar a partir de 1964.

“A ALN propunha uma resistência para criar um clima que pudesse haver um conflito grande e trouxesse, assim, alguns militares para a arena política, que eu conhecia através do Marighella e eram clandestinos, ou seja, não eram expostos”, disse.

Em 1969, foi detido, no Rio de Janeiro, pelo Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), do Exército, torturado por diversas vezes nos porões dos quartéis, e libertado, em 1970, através do acordo que estabeleceu a liberdade de presos políticos em troca do embaixador da Alemanha Ocidental, Ehrenfried von Holleben, também sequestrado no estado fluminense.

“O Marighella tinha razão. Seres humanos que torturam seres humanos são verdadeiros animais. Imaginar você enfiar qualquer coisa no outro e fazer o ‘cara’ falar, por ele não querer falar, não é coisa de ser humano. São pessoas totalmente fora do contexto”, relatou.

“Eu guardo, desses tempos, uma memória sucinta do que essas pessoas (militares) tentavam fazer e, na maioria das vezes acabavam conseguindo, tirar informações de seres humanos fora de combate”, completou.

Carta mobilizadora

Sobre a conjuntura que desencadeou a produção do simbólico documento trabalhista, Domingos Fernandes detalha cada etapa da longa jornada até a realização do amplo encontro na capital portuguesa.

“Nós começamos a armar um grupo de pessoas, que estavam em Lisboa, a partir do Comitê de Anistia, que recebia os exilados brasileiros. Assim, articulamos para receber o Brizola e, claro, com complacência do Mário Soares”, descreve, ao mencionar o primeiro-ministro de Portugal e cofundador do Partido Socialista.

No processo de nucleação dos aglomerados políticos e ordenamento para reorganização do então PTB, originário desde Getúlio Vargas, o militante conta detalhes das movimentações e articulações para a retomada democrática, que chegou em paralelo à ruína do “milagre econômico” oferecido pelo governo brasileiro.

“A postura do Brizola era uma só. Ele achava que este partido deveria retomar a história pré-golpe e se tornar um ‘estuário’ de uma resistência”, comentou, ao descrever ainda as divergências de opiniões sobre o retorno do ex-governador do Rio Grande do Sul para o seu país e a construção de uma nova sigla, o PDT, além de citar a união para alcançar a presidência da República com estruturas democratizadas.

Disponibilizado gratuitamente pelo CMT – organização vinculada ao PDT e à Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini (FLB-AP) –, o conteúdo está presente nas principais plataformas digitais, incluindo Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e Anchor.

Confira, na íntegra: https://open.spotify.com/episode/4ED7eMkENxQgPEX9vDgQL8