“João Goulart foi o mais injustiçados dos políticos brasileiros”


Osvaldo Maneschy e Apio Gomes
06/06/2019

Nascido nos anos 60, o ex-vereador e ex-prefeito de Osório por três mandatos Romildo Bolzan Júnior conviveu, dentro de casa, com os nomes dos grandes líderes trabalhistas – Vargas, Jango e Brizola – por conta de seu pai, professor, que foi para Osório trabalhar na escola e acabou se radicando lá, cidade que o elegeu vereador pelo velho PTB e depois prefeito, ao longo dos anos 50, década em que Brizola governou o Rio Grande do Sul.

Atual presidente do Grêmio Porto-Alegrense, Bolzan Júnior presidiu o PDT gaúcho por oito anos e se define – por ter seguido os passos do pai na política – como um “egresso de pai trabalhista”. Jango foi um nome muito presente em toda a sua vida, através do seu pai; e sempre foi para Bolzan uma espécie de exemplo, “pelo que significava para o meu pai. Sempre o admirei; sempre tive por ele empatia e identificação”.

Seu amadurecimento político, através das leituras e do melhor conhecimento dos fatos, consolidou o ponto de vista herdado de pai de que Jango foi uma grande liderança, um grande estadista. “Jango recebeu a oportunidade de ser ministro – com a simpatia do presidente Getúlio Vargas – e se mostrou capaz, competente e identificado política e ideologicamente com compromissos claros e nítidos” com o Trabalhismo.

Para Bolzan, Jango se fez vice-presidente da República e depois Presidente exatamente por conta de sua capacidade, consciência política e, principalmente, sua liderança. “Jango sempre se elegeu única e exclusivamente Vice-Presidente da República. E ao se eleger vice, se elegeu com mais voto, às vezes, que o próprio Presidente. Isto é liderança”, argumentou.

Bolzan falou sobre a importância da mobilização popular liderada por Brizola – a campanha da Legalidade –, que “foi um dos movimentos populares mais importantes, mais expressivos e emblemáticos para defender um governo que se poderia discordar ou não discordar, mas que era legítimo”. Também falou sobre as reformas de base de Jango que “se tivessem vingado por inteiro, o país não seria mais este que vivemos”.

“Estaríamos numa ordem social muito mais justa”, em um país mais igualitário, socialmente mais identificado com as demandas populares. O golpe militar de 64, em sua visão “e sem a menor dúvida, foi um golpe contra a própria cidadania”.

Para Bolzan, “as reformas de base de Jango – no campo, na cidade e no setor público – davam conteúdo e visão muito clara de que o Brasil tinha que ser dos brasileiros, e justo com todos”. Defensor e propagador do Trabalhismo, Bolzan o considera como a corrente política que mais contribuiu na preservação do patrimônio público, no impulsionamento do desenvolvimento nacional, por conta da visão estratégica de que cada setor da vida brasileira precisava de uma intervenção estatal em prol do desenvolvimento.

“O Trabalhismo foi a ideologia política que mais criou condições de dar aos brasileiros autonomia, autossuficiência, autoestima e, por consequência, soberania”. O Trabalhismo, acrescentou, foi fundamental para que o povo brasileiro se sentisse dono, efetivamente, dos bens públicos que lhe pertencem – bens comuns que estão no subsolo, como o petróleo e os minérios; bens como moradia; e em toda ação que vise exclusivamente a patrocinar os meios de produção de maneira mais justa para servir a todos os brasileiros.

A elite brasileira, na opinião de Bolzan, “sempre teve um sentimento forte de egoísmo”; egoísmo dos que acham que são os donos dos meios de produção e o povo não é dono de nada. “É muito simplista dizer: eu produzo, eu emprego, eu corro riscos; por consequência, sou dono de tudo”. Trazendo a questão para os dias de hoje, de desregulamentações a partir de decisões do governo recém-empossado, Bolzan dispara: “O que estamos vendo hoje é o exato reflexo do egoísmo das elites” brasileiras.

A chamada “carteira verde e amarela” é uma iniciativa que faz parte da mesma iniciativa que motivou o golpe de 64, ao caminhar junto com a desnacionalização de empresas estatais estratégicas para o país. Para Bolzan, os movimentos de hoje, dentro da ordem democrática, refletem os mesmos movimentos ocorridos em 64, porque os conteúdos ideológicos são idênticos. “Jango foi deposto porque criou um país muito mais justo, mais capaz de produzir igualdade entre as pessoas, mais capaz de criar o bem estar para todos”.

Jango foi derrubado, na opinião de Bolzan, por um movimento militar contra o avanço social do país porque Jango foi a síntese da melhor qualidade social que o Brasil poderia produzir. “Ele caiu por conta de suas qualidades”, sintetizou.

E evitou também, para preservar a integridade do povo brasileiro, o derramamento de sangue em 1964. “Eu respeito este tipo de decisão, dou legitimidade a este tipo de decisão e creio que Jango teve todos os fatores de sua decisão pesados para que isto acontecesse”, argumentou Bolzan.

“Jango era um ser humano despojado, homem inteligentíssimo, grande negociador, grande pecuarista, homem capaz de aumentar e fazer patrimônio”, mas também um homem que sabia muito bem o que fazia: um grande político, grande estadista e, principalmente, homem solidário – porque não se vinculava ao que definiu como “poder fechado”: as elites.

Jango, concluiu, “foi um brasileiro da melhor espécie” e o mais injustiçados dos políticos brasileiros, porque sofreu na carne todos os processos ideológicos represados.

Confira a entrevista completa abaixo: