Petição ao Procurador Geral da República

 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, DR. ANTÔNIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA


 

MIRO TEIXEIRA, brasileiro, advogado e jornalista, deputado federal representante do povo do Estado do Rio de Janeiro, pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, com fulcro nos arts. 127, caput, 129, VI, VIII e IX, da Constituição Federal; no art. 8.º da Lei Complementar nº. 75/9; no art. 26 da Lei n.º 8.625/93; e no art. 4.º, parágrafo único, do Código de Processo Penal; regulamentados pela Resolução n.º 13, de 2 de outubro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público; vem expor e requerer a Vossa Excelência o seguinte:

I. OS FATOS

O jornal A Folha de São Paulo, em sua edição de domingo, dia 27 de janeiro de 2008, sob os títulos “Goulart foi morto a pedido do Brasil, diz ex-agente uruguaio” e “Fleury deu a ordem final, diz ex-agente”, bem como em seu sítio na Internet1, publicou, além de outras matérias relacionadas com o assunto, entrevista concedida à jornalista Simone Iglesias, da Agência Folha em Porto Alegre, por MARIO NEIRA BARREIRO, 54, ex-agente do serviço de inteligência do governo uruguaio, preso desde 2003 na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas/RS (cópias das matérias anexas).

Na entrevista, o Sr. BARREIRO afirma ter espionado e assassinado o ex-Presidente da República JOÃO GOULART, a mando do governo brasileiro, dando detalhes da operação homicida que denonimou “Escorpião”, como se extrai de suas próprias declarações:

“FOLHA - Qual era o interesse do Uruguai em vigiar Jango?

MARIO NEIRA BARREIRO - Após o golpe no Brasil, o serviço de inteligência do governo do Uruguai se viu obrigado a cooperar porque era totalmente dependente do Brasil. Goulart, para nós, era uma pessoa que não tinha nenhuma importância.

“FOLHA - Quando passou a vigiá-lo?

BARREIRO - Eu o monitorei de meados de 1973 até sua morte, em 6 de dezembro de 1976. Monitorei tudo o que falava através do telefone, de escuta ambiental e em lugares públicos.

“FOLHA - O sr. colocou microfones na casa? Como ouvia as conversas?

BARREIRO - Estive na fazenda de Maldonado para colocar uma estação repetidora que captava sinais dos microfones de dentro da casa e retransmitia para nós. Esta estação repetidora foi colocada numa caixa de força que havia na fazenda. Aproveitamos essa fonte de energia para alimentar os aparelhos eletrônicos e para ampliar as escutas. Isso possibilitava que ouvíssemos as conversas a 10, 12 km de distância. Ficávamos no hipódromo de Maldonado ouvindo o que Jango falava.

“FOLHA - Alguma vez falou com ele?

BARREIRO - Sim. Eu e um colega estávamos vigiando a fazenda, fingindo que um pneu da camionete estava furado. Ele nos viu e veio até nós caminhando e fumando. Perguntou se precisávamos de ajuda. Estava frio e ele nos convidou para tomar um café. Eu pensei: "Ou ele é muito burro ou muito bom". Ele me convidou para entrar na fazenda. Meu colega não quis ir.

“Depois que fiz um lanche e tomei o café, eu disse: "Desculpa, senhor, qual é o seu nome?". Ele me olhou e disse: "Mas como, rapaz, tu não sabes quem sou eu? Tu estás me vigiando. Acha que sou bobo? Fui presidente do Brasil porque sou burro? Estou te convidando para minha fazenda porque não tenho nada a esconder. Sei que estão me vigiando, mas não sou inimigo de vocês". Eu disse que ele estava enganado, me fiz de bobo, mas ele era inteligente.”

“FOLHA - Como foi decidido que Jango deveria ser morto?

BARREIRO - O que levou à morte foram interpretações erradas, exageradas do que ele falava. Fleury foi quem deu a palavra final. Em uma reunião no Uruguai, disse que Jango era um conspirador e que falaria com Geisel para dar um ponto final no assunto. Depois, em outra reunião no Uruguai, disse -não para mim, mas para um major e um general- que tinha conversado com Geisel dizendo que Jango estava complicando e que ele sabia o que deveria ser feito. E ele [Geisel] disse: "Faça e não me diga mais nada sobre Goulart".

1 Fonte consultada em 28/1/08:

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2701200802.htm

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2701200804.htm

A morte não foi decidida pelo governo uruguaio, mas pelo governo do Brasil, influenciado pela CIA.

“FOLHA - Qual foi o papel da CIA?

BARREIRO - A CIA pagou fortunas para saber o que Jango falava e foi responsável por muita coisa, mas não quero falar sobre isso porque tenho medo.

“FOLHA - Como Jango foi morto?

BARREIRO - Foi morto como resultado de uma troca proposital de medicamentos. Ele tomava Isordil, Adelfan e Nifodin, que eram para o coração. Havia um médico-legista que se chamava Carlos Milles. Ele era médico e capitão do serviço secreto. O primeiro ingrediente químico veio da CIA e foi testado com cachorros e doentes terminais. O doutor deu os remédios e eles morreram. Ele desidratava os compostos, tinha cloreto de potássio. Não posso dizer a fórmula química, porque não sei. Ele colocava dentro de um comprimido.”

“FOLHA - Como as cápsulas eram colocadas nos remédios de Jango?

BARREIRO - Ele era desorganizado. Abria um frasco, tomava alguns, na fazenda abria outro. Tinha sete, oito frascos abertos. E colocávamos [referência ao grupo que monitorava Jango] um remédio em cada frasco. Colocamos os comprimidos em vários lugares: no escritório na fazenda, no porta-luvas do carro e no Hotel Liberty.”

As declarações do Sr. BARREIRO acrescentam novos elementos aos trabalhos investigativos realizados pela Comissão instituída em 2001 pela Câmara dos Deputados, com o objetivo de esclarecer as circunstâncias da morte do Ex-Presidente JOÃO GOULART, ocorrida em 6 de dezembro de 1976, cujo relator, o Deputado signatário, assim concluiu seus trabalhos, conforme Relatório Final1:

1Brasil. Congresso. Câmara dos Deputados. Comissão Externa Destinada a Esclarecer em que Circunstância Ocorreu a Morte do Ex-Presidente João Goulart, em 6 de dezembro de 1976, na Estância de sua Propriedade, na Província de Corrientes, na Argentina.

Relatório final – Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2004.


2ª parte...

 

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, DR. ANTÔNIO FERNANDO BARROS E SILVA DE SOUZA



 


MIRO TEIXEIRA, brasileiro, advogado e jornalista, deputado federal representante do povo do Estado do Rio de Janeiro, pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT, com fulcro nos arts. 127, caput, 129, VI, VIII e IX, da Constituição Federal; no art. 8.º da Lei Complementar nº. 75/9; no art. 26 da Lei n.º 8.625/93; e no art. 4.º, parágrafo único, do Código de Processo Penal; regulamentados pela Resolução n.º 13, de 2 de outubro de 2006, do Conselho Nacional do Ministério Público; vem expor e requerer a Vossa Excelência o seguinte:


I. OS FATOS


O jornal A Folha de São Paulo, em sua edição de domingo, dia 27 de janeiro de 2008, sob os títulos “Goulart foi morto a pedido do Brasil, diz ex-agente uruguaio” e “Fleury deu a ordem final, diz ex-agente”, bem como em seu sítio na Internet1, publicou, além de outras matérias relacionadas com o assunto, entrevista concedida à jornalista Simone Iglesias, da Agência Folha em Porto Alegre, por MARIO NEIRA BARREIRO, 54, ex-agente do serviço de inteligência do governo uruguaio, preso desde 2003 na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas/RS (cópias das matérias anexas).


Na entrevista, o Sr. BARREIRO afirma ter espionado e assassinado o ex-Presidente da República JOÃO GOULART, a mando do governo brasileiro, dando detalhes da operação homicida que denonimou “Escorpião”, como se extrai de suas próprias declarações:


“FOLHA – Qual era o interesse do Uruguai em vigiar Jango?


MARIO NEIRA BARREIRO – Após o golpe no Brasil, o serviço de inteligência do governo do Uruguai se viu obrigado a cooperar porque era totalmente dependente do Brasil. Goulart, para nós, era uma pessoa que não tinha nenhuma importância.


“FOLHA – Quando passou a vigiá-lo?


BARREIRO – Eu o monitorei de meados de 1973 até sua morte, em 6 de dezembro de 1976. Monitorei tudo o que falava através do telefone, de escuta ambiental e em lugares públicos.


“FOLHA – O sr. colocou microfones na casa? Como ouvia as conversas?


BARREIRO – Estive na fazenda de Maldonado para colocar uma estação repetidora que captava sinais dos microfones de dentro da casa e retransmitia para nós. Esta estação repetidora foi colocada numa caixa de força que havia na fazenda. Aproveitamos essa fonte de energia para alimentar os aparelhos eletrônicos e para ampliar as escutas. Isso possibilitava que ouvíssemos as conversas a 10, 12 km de distância. Ficávamos no hipódromo de Maldonado ouvindo o que Jango falava.


“FOLHA – Alguma vez falou com ele?


BARREIRO – Sim. Eu e um colega estávamos vigiando a fazenda, fingindo que um pneu da camionete estava furado. Ele nos viu e veio até nós caminhando e fumando. Perguntou se precisávamos de ajuda. Estava frio e ele nos convidou para tomar um café. Eu pensei: “Ou ele é muito burro ou muito bom”. Ele me convidou para entrar na fazenda. Meu colega não quis ir.


“Depois que fiz um lanche e tomei o café, eu disse: “Desculpa, senhor, qual é o seu nome?”. Ele me olhou e disse: “Mas como, rapaz, tu não sabes quem sou eu? Tu estás me vigiando. Acha que sou bobo? Fui presidente do Brasil porque sou burro? Estou te convidando para minha fazenda porque não tenho nada a esconder. Sei que estão me vigiando, mas não sou inimigo de vocês”. Eu disse que ele estava enganado, me fiz de bobo, mas ele era inteligente.”


“FOLHA – Como foi decidido que Jango deveria ser morto?


BARREIRO – O que levou à morte foram interpretações erradas, exageradas do que ele falava. Fleury foi quem deu a palavra final. Em uma reunião no Uruguai, disse que Jango era um conspirador e que falaria com Geisel para dar um ponto final no assunto. Depois, em outra reunião no Uruguai, disse -não para mim, mas para um major e um general- que tinha conversado com Geisel dizendo que Jango estava complicando e que ele sabia o que deveria ser feito. E ele [Geisel] disse: “Faça e não me diga mais nada sobre Goulart”.



1 Fonte consultada em 28/1/08:


http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2701200802.htm


http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2701200804.htm


A morte não foi decidida pelo governo uruguaio, mas pelo governo do Brasil, influenciado pela CIA.


“FOLHA – Qual foi o papel da CIA?


BARREIRO – A CIA pagou fortunas para saber o que Jango falava e foi responsável por muita coisa, mas não quero falar sobre isso porque tenho medo.


“FOLHA – Como Jango foi morto?


BARREIRO – Foi morto como resultado de uma troca proposital de medicamentos. Ele tomava Isordil, Adelfan e Nifodin, que eram para o coração. Havia um médico-legista que se chamava Carlos Milles. Ele era médico e capitão do serviço secreto. O primeiro ingrediente químico veio da CIA e foi testado com cachorros e doentes terminais. O doutor deu os remédios e eles morreram. Ele desidratava os compostos, tinha cloreto de potássio. Não posso dizer a fórmula química, porque não sei. Ele colocava dentro de um comprimido.”


“FOLHA – Como as cápsulas eram colocadas nos remédios de Jango?


BARREIRO – Ele era desorganizado. Abria um frasco, tomava alguns, na fazenda abria outro. Tinha sete, oito frascos abertos. E colocávamos [referência ao grupo que monitorava Jango] um remédio em cada frasco. Colocamos os comprimidos em vários lugares: no escritório na fazenda, no porta-luvas do carro e no Hotel Liberty.”


As declarações do Sr. BARREIRO acrescentam novos elementos aos trabalhos investigativos realizados pela Comissão instituída em 2001 pela Câmara dos Deputados, com o objetivo de esclarecer as circunstâncias da morte do Ex-Presidente JOÃO GOULART, ocorrida em 6 de dezembro de 1976, cujo relator, o Deputado signatário, assim concluiu seus trabalhos, conforme Relatório Final1:



1Brasil. Congresso. Câmara dos Deputados. Comissão Externa Destinada a Esclarecer em que Circunstância Ocorreu a Morte do Ex-Presidente João Goulart, em 6 de dezembro de 1976, na Estância de sua Propriedade, na Província de Corrientes, na Argentina.


Relatório final – Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2004.


2ª parte…