Tinha 11 anos quando, pela primeira vez, ouvi o nome de Neiva Moreira. Estávamos naqueles apaixonantes anos que marcaram a luta final contra a ditadura militar, a esperança voava com os ventos rumo aos pulmões de todos, e milhares de crianças e adolescentes começavam a conhecer a história que, na época, não se ensinava na escola.
Meu pai, também parlamentar cassado e preso arbitrariamente em 1964, e minha mãe passaram a me narrar a nossa história familiar – num período em que infelizmente o monstro ainda não havia sido derrotado pelos heróis (ao contrário, muitos destes estavam desaparecidos ou mortos). Na semana que passou, o capítulo final dessa história, cheia de peripécias, começou a ser escrito, com a instalação da Comissão da Verdade, em homenagem, sobretudo aos que sentem todos os dias a renovação da morte dos seus entes queridos, perversamente privados do direito a um funeral (lembro Antígona, de Sófocles).
Graças a Deus, Neiva Moreira não foi assassinado pela ditadura e teve uma longa vida, mas tenho certeza de que – como muitos – viu morrer uma parte de si naqueles tenebrosos anos em que só existia a lei dos fascistas: eu posso, eu quero, eu mando.
Não tive a honra de conviver muito com Neiva. Mas tenho muitas recordações, como a campanha ao Senado que fiz para ele em 1986, quando era secretário geral do Diretório Central dos Estudantes da Ufma, ou a homenagem que o PCdoB fez a ele em 2007, com o Prêmio José Augusto Mochel.
Mesmo tendo lido e ouvido durante anos sobre sua intensa trajetória política, Neiva não deixou de me impressionar, pessoalmente, pela paixão com que debatia os temas da vida nacional e de nosso Maranhão. Esse envolvimento intenso talvez seja a principal explicação para o fato de Neiva ser uma dessas raras figuras que conseguem atuar em diferentes esferas da vida pública e destacar-se em todas.
No jornalismo, Neiva é reconhecido por seus pares não só nacionalmente, como em diferentes países, pelo trabalho desenvolvido com a publicação Cadernos do Terceiro Mundo. Desenvolvido em conjunto com sua então companheira, a jornalista uruguaia Beatriz Bissio, Cadernos foi iniciado no período em que Neiva estava no exílio. Difundia, na época, todos os movimentos de resistência e libertação nacional, não só na América Latina, como na Ásia e África. Hoje é material único de registro de um período histórico de mudanças mundiais, com a formação de dezenas de países em processos de libertação das colônias na África, vitória de governos nacionalistas na Ásia e resistência popular às ditaduras na América Latina.
Mesmo com a cabeça no mundo e com seu olhar jornalístico, Neiva Moreira sempre soube conjugá-los com a luta política por melhoria das condições de vida no nosso país e no Maranhão. Foi um fundadores do PDT, ao lado de figuras como o estadista Leonel Brizola, o antropólogo Darcy Ribeiro, o líder negro Abdias Nascimento e o governador Jackson Lago. Buscava retomar, com sua volta após a Anistia, a linha trabalhista no Brasil. Uma linhagem de pensamento que havia sido iniciada pelo presidente Getúlio Vargas e continuada pelo seu jovem ministro do Trabalho João Goulart, o Jango, responsáveis pelas primeiras conquistas legais de direitos dos trabalhadores no Brasil.
No Maranhão, Neiva foi uma liderança essencial para a luta contra o domínio oligárquico, próximo de completar 50 anos. Em nível nacional, foi presidente do PDT e deputado federal pelo partido, representando nosso Maranhão em várias legislaturas.
Hoje a bandeira do trabalhismo vive em mãos de tantos queridos amigos meus, como o presidente pedetista Carlos Lupi e o ministro Brizola Neto. Já a luta pela autêntica libertação do Maranhão passa ainda mais a ser responsabilidade de todos nós que acreditamos que nosso estado, tão rico de recursos naturais e da força do nosso povo, não merece continuar a ser conhecido por frequentar assiduamente as últimas colocações em todos os rankings nacionais de desenvolvimento.
Abraçando a jovem e brilhante Micaela, manifesto a minha solidariedade a toda a família de Neiva Moreira. Saudações a todos os companheiros do PDT, nas pessoas do presidente Julião Amin e de Clay Lago.
Jornal Pequeno