BRASÍLIA – Após um longo período de pouca exposição pública, o deputado carioca Miro Teixeira (PDT) voltou aos holofotes como uma das estrelas da CPI do Cachoeira. Com uma defesa ininterrupta da atuação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e da imprensa, Miro tem atuado para impedir que os desvios de foco retirem do cerne o que realmente importa: a corrupção. Em seu décimo mandato, Miro é otimista: “O dia que perder o otimismo, eu não me candidato mais”. E diz ainda que nessa CPI pode haver um fato inédito: “creio que perseguir o caminho do dinheiro e retomar o dinheiro vai ser inédito”.
O GLOBO: O senhor chegou aqui (no Congresso) em 1971. Ulysses Guimarães falava que o próximo Congresso seria sempre pior. Qual sua percepção?
MIRO: Doutor Ulysses tinha bom humor e fez uma boa piada. Isso serve para valorizar os bons momentos de cada legislatura. Não existe uma igual à outra.
O senhor participou de duas grandes CPIs (Collor e Anões do Orçamento). Vislumbra diferença entre aquelas e a atual?
MIRO: Logo de início, porque as CPIs, quando encontram indício de crime, remetem suas conclusões para o Ministério Público. Nós já começamos essa CPI com a requisição de inquérito criminal pelo Ministério Público contra o senador Demóstenes Torres e três ou quatro deputados, com processos iniciados e milhares de horas de gravação feitas. Você tem um material que está ensejando a percepção de que os três Poderes da República podem trabalhar em estreita colaboração para impedir a impunidade. Tem várias forças atuando, inclusive líderes partidários que não integram a CPI.
Pode haver um entendimento em relação aos governadores?
MIRO: Não. Não pode haver saída do princípio da impessoalidade da vida pública. Simplificando, é o seguinte: não há proteções pessoais. Quem for culpado vai pagar. Quem for inocente, não vai ser perseguido. É isso.
Na sua opinião, o que o procurador-geral fez?
MIRO: Você tem uma investigação com muita gente. Aí no meio tem cinco pessoas com foro especial no Supremo. Ele recebe aquilo e lê. Só que não tinha entrado o Clube do Nextel. Quando é deferida a retomada das gravações, aí já no ar o Clube Nextel da Rua 46 de Nova York, começa a entrar gravação ‘pra cacete’ do Cachoeira com o Demóstenes. Em vez de ficar procurando falha, que não existe, e tentar inventar omissão, que não existe, é melhor entendermos que só chegamos a este ponto graças ao magnífico funcionamento da Procuradoria da República e da Polícia Federal.
O GLOBO: O senhor concorda com a avaliação do PGR de que os críticos da atuação dele estão preocupados com o julgamento do mensalão?
MIRO: Acho que é um direito dele pensar dessa forma. Minha avaliação é que é desvio da pauta. Não tenho dúvida de que há um mal-estar de alguns com a discussão de corrupção, lavagem de dinheiro.
Há um sentimento de alguns parlamentares da CPI de fazer uma caça às bruxas na imprensa?
MIRO: Acho que já houve mais, mas penso que a maioria é contra. Acho que no começo pode ter tido muito rancor, que tomou o plenário, mas acho que hoje isso está muito limitado a um ou outro personagem.
O senhor foi membro da CPI do Collor. Como é participar do mesmo trabalho com ele?
MIRO: Dentro do princípio da impessoalidade da vida pública, não tenho relação com ele, sou capaz de travar um debate com ele e até o momento só tive ideias divergentes. Mas se tiver alguma convergente, não terei o menor embaraço. Lamentavelmente até agora não concordei com nada, porque ele ataca a procuradoria da República, a imprensa, e ali estamos reunidos numa CPI para discutir corrupção.
Considera que o presidente Collor, tendo deixado o governo por impeachment, tem algum impedimento para investigar corrupção?
MIRO: Ele não está fazendo uma investigação sobre corrupção. Está atacando a imprensa e o Ministério Público. Pode ser que quando começarem a chegar os sigilos quebrados de contas bancárias, dos telefones, ele tenha uma contribuição a dar.
Acredita que o governo pode interferir na CPI?
MIRO: Nessa CPI, como em qualquer grande CPI, só quem interfere é sua excelência o fato. Você teve a CPI do Collor e a CPI dos Correios. Se o governo pudesse interferir em CPI, o desfecho das duas teria sido diferente. Então, isso não é uma opinião, é uma constatação da nossa história recente.
O foco é a recuperação do dinheiro público desviado?
MIRO: Eu tenho ido atrás da recuperação do dinheiro porque o inquérito está feito. Precisamos saber, afinal de contas, do que é que precisam o Tribunal de Contas da União e a Controladoria-Geral da União para impedir que essas coisas aconteçam. Por que não pegaram isso? Por que não impediram?
Qual é o fim que o senhor prevê para a CPI?
MIRO: A CPI, surpreendentemente, logo de início já desencadeou uma série de investigações. A primeira delas a da Delta. Se fosse o fim da CPI, já seria um conhecimento tremendo para ajudar o país a conduzir novas investigações e punir essas pessoas. Mas eu creio que o caminho do dinheiro e retomar o dinheiro vai ser inédito.
Jornal “O Globo”/OM