Anunciado oficialmente como um dos responsáveis pela coordenação do programa de governo por Ciro Gomes na última quinta (8) – durante o lançamento da sua pré candidatura à Presidência pelo PDT, Nelson Marconi deu entrevista à Folha de São Paulo e afirmou que “mercado e Estado são complementares”. Marconi também se mostrou contrário à privatização de setores estratégicos da economia – como energia e petróleo.
Formado em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1987), mestrado em Economia de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – SP (1993) e doutorado em Economia de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – SP (2001), Marconi é coordenador do curso de Graduação da Escola de Economia de São Paulo da FGV, membro do corpo permanente do curso de pós-graduação em Administração Pública da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV, e professor associado (licenciado) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, entre outros títulos. Leia a íntegra da entrevista.
Alexa Salomão (Folha de São Paulo)
Tendo ao seu lado Roberto Mangabeira Unger e Mauro Benevides Filho, o economista Nelson Marconi foi oficialmente anunciado como responsável pela coordenação do programa de campanha de Ciro Gomes, pré-candidato à presidência pelo PDT.
Marconi é, “sem medo de ser feliz”, desenvolvimentista. Acredita que o estado deve atuar na economia e que a produção industrial e o consumo geram crescimento.
Tem restrições a privatizações em setores que considera estratégicos, como energia. Não venderia a Eletrobras e pode rever o marco do setor petróleo. Mas diz que as reformas são essenciais e que não há divisão entre estado e mercado: “eles são complementares”, afirma.
Folha – Como ocorreu a aproximação com Ciro Gomes?
Nelson Marconi – Começou há uns dois anos, na Fundação Getulio Vargas, num seminário sobre novo desenvolvimentismo. Eu sou um desenvolvimentista sem medo de ser feliz. Nós convidamos, Ciro veio e gostou. Mas ficamos próximos no final do ano passado quando achei que ele seria um bom candidato. Organizei reuniões em casa com 30, 40 pessoas para falarem as suas ideias para ele.
Quem participava?
Acadêmicos da FGV, UFRJ, da UnB, USP, PUC. Alguns empresários, gente do mercado financeiro –e não me pergunte os nomes. Me comprometi a não citar ninguém.
O plano de governo já teria alguma direção?
Temos um princípio geral importante: não existe divisão entre estado e mercado. Eles são complementares. Nos últimos anos, o mercado foi negligenciado. Não pode isso, porque é ele que traz soluções de eficiência. Mas também não podemos agora ir para o extremo oposto.
No que se refere as medidas, o programa está em um estágio inicial, mas posso adiantar algumas coisas que eu pessoalmente tenho em vista. Primeiro, é preciso desenvolver a indústria e dos serviços que fazem parte desse setor, como design, engenharia, automação e boa parte da pesquisa que gera inovação.
Para muitos economistas, Dilma Rousseff errou ao ampliar subsídios e fazer nacionalização artificial de algumas áreas para fortalecer a indústria. Vocês vão nessa linha?
Não, é diferente. Dilma cometeu muitos erros. Ciro e eu já discutimos isso. Temos de defender o interesse da empresa nacional, mas isso não significa não ter empresa internacional aqui ou fechar o mercado. Significa defender a participação do Brasil no mercado externo, promovendo a exportação de industrializados. A prioridade é a indústria 4.0. Aí a associação entre capital privado, via venture capital, universidades e institutos de pesquisa, é fundamental.
Qual a posição em relação a privatizações?
Entendemos que existem setores estratégicos –energia elétrica, petróleo– que não podem ser privatizados. No que se refere a concessões, ora, por favor: é ótimo privatizar estradas, aeroportos.
Mas energia é a área que mais atrai investimentos privados hoje, especialmente chinês.
Pois então, como é que vamos dar uma usina hidrelétrica para um estrangeiro? E se tivermos um problema de fornecimento? Vamos ter de negociar com os chineses? Empresas chinesas são financiadas pelo governo chinês. Não tem muita lógica entregar uma riqueza nacional para ser gerenciada por empresas ligada a um governo estrangeiro.
Então, no programa não haveria privatização da Eletrobras?
Até podemos conversar sobre a vende projetos menores na área, mas a Eletrobras, não.
As regras no setor de petróleo foram alteradas para uma maior participação de empresas privadas. Vocês manteriam a mudança ou iriam rever?
Esse setor gera muita pesquisa e inovação para o resto da economia. A gente entende que o país tem uma reserva importante, o pré-sal. Não faz sentido vender petróleo por um preço muito menor do que a receita que ele vai gerar no futuro, como vimos acontecer recentemente. Acho complicado um modelo que leve a esse tipo de abertura.
Mudariam as regras outra vez?
Isso não está fechado, mas vamos avaliar, sim.
As reformas são consideradas prioridades para muitos pré-candidatos. E para vocês?
Isso sim! Somos a favor de todas: fiscal, da Previdência, tributária. A tributária é uma prioridade. Bernard Appy [economista especializado em tributação] tem uma proposta muito interessante e estamos olhando. Mas avaliamos também mexer na tributação sobre herança, sobre lucros e dividendo –desde que não haja bitributação. Enfim, passar o ônus mais para a renda do que para a produção.
O senhor era crítico da reforma da Previdência que vinha sendo feita. Qual seria a proposta de vocês?
Como o próprio Ciro já falou, ter uma idade mínima é importante. Uma ideia que estamos amadurecendo é ampliar o regime de capitalização [o beneficiário é responsável por fazer sua poupança].
Já discutiram a questão da segurança?
Esse tema é central. Nós já vínhamos preocupados com a questão antes da intervenção no Rio. Melhorar a segurança passa necessariamente por uma política de combate ao tráfico de drogas e investimentos em inteligência.
E na educação?
O Ciro tem uma experiência muito boa no Ceará, em especial na educação básica, que tem hoje os melhores indicadores de educação do país. Temos a preocupação de conseguir replicar essa experiência em todo o Brasil. Ampliar a experiência de Sobral.
Qual a posição em relação ao Bolsa Família?
O nosso ideal seria ter um programa social que atingisse todos até uma determinada faixa de renda, como um salário mínimo, mas do ponto de vista fiscal, a gente não sabe se isso é possível.
Para muitos economistas, a prioridade é resolver o déficit fiscal porque ele está pressionando a dívida. Como o senhor vê a questão?
De imediato, precisa mexer nos privilégios do setor público, fazer um pente fino para tornar o estado eficiente. Olhar para os muitos subsídios que estão aí, custam bilhões, e avaliar quais devem ser mantidos. A questão fiscal é importantíssima para mim e para o Ciro. Ele nunca governou com déficit. É experiente. É o melhor candidato –mas eu sou suspeito para falar.
Muitos dizem que ele é uma pessoa difícil?
Ciro é absurdamente capacitado e inteligente. Tem visão de país e um projeto para o Brasil. Mas tem um estilo político próprio. Fala forte. Mas o Brasil está passando por uma fase que precisa disso mesmo, de coragem para mudar. E ele é um cara corajoso.