Tribunal de Justiça aceita pedido do Ministério Público para julgar extinta ação civil pública por falta de provas e determina desbloqueio de bens do ex-prefeito, com base na Lei de Improbidade e na Lei Anticorrupção
A 3ª Vara Cível da Comarca de Niterói aceitou pedido do Ministério Público do Rio de Janeiro para extinguir Ação Civil Pública contra o ex-prefeito Rodrigo Neves por improbidade administrativa. Na decisão, o juíz também determinou o desbloqueio dos bens do ex-prefeito. No pedido, a promotora Renata Scarpa Fernandes Borges entendeu que a acusação, baseada apenas em delação premiada, não encontrou nenhuma prova.
Em dezembro de 2018, Rodrigo Neves, atual pré-candidato do PDT ao Governo do Rio de Janeiro, chegou a ser preso por 93 dias, mas foi solto por seis votos a um, por determinação do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, reassumiu a Prefeitura de Niterói, completou o mandato com 85% de aprovação popular e elegeu o sucessor com 62% dos votos.
“Acolho o parecer ministerial de fls. 2806/2823 para indeferir a inicial e julgar extinto o feito sem resolução do mérito com fulcro nos artigos 330 c/c 485, I do Código de Processo Civil c/c art. 17, §6º e §6º-B, da Lei 8.429/1992”, diz um trecho da sentença. “Consequentemente revogo a liminar deferida às fls. 1808/1814, que decretou a indisponibilidade dos bens de Rodrigo Neves, devendo ser adotadas as medidas necessárias para eventual desbloqueio”.
Para o ex-prefeito Rodrigo Neves, a decisão traz alívio e conforto para a família. “Após quase cinco anos de um processo absurdo, infame e ilegal para tentar destruir a minha reputação construída por uma vida pública de dedicação e seriedade, sem nunca ter sido ouvido, a petição do MP e a decisão da Justiça pela extinção do processo aliviam o sofrimento injusto causado à minha família e a mim”, disse Rodrigo Neves.
O processo que culminou com a prisão do ex-prefeito em 2018 tem sua história contada em detalhes no livro ‘Golpe Derrotado’, assinado pelo jornalista PH Noronha
“Em 2018, grupos políticos tentaram dar um golpe para tomar a Prefeitura de Niterói, mas não conseguiram. Tenho mais de 20 anos de uma vida pública limpa e simples, não sou réu em nenhuma ação de improbidade administrativa, todas as contas dos meus oito anos de mandato foram aprovadas com louvor, jamais tive qualquer condenação em qualquer instância da justiça e sou ficha limpa”, resune Neves, que acrescenta: “Vamos seguir lutando pelo Estado democrático de direito, pela justiça social, pela transparência e pelo devido processo legal”.
Denúncia inepta
No pedido de extinção da ação civil pública, a promotoria entende que as delações premiadas que ensejaram a abertura do processo – por supostos desvios nos valores de gratuidade das passagens de transporte público na cidade – são insuficientes para demonstrar quaisquer atos ilícitos.
“Haja vista a ausência dos requisitos exigidos pelo novo art. 17, parágrafo sexto, da Lei 8.429/1992, percebe-se que a inicial é inepta, vez que não individualiza a conduta com a demonstração de elementos mínimos, tampouco contém indícios suficientes a respeito da veracidade dos fatos e do dolo dos agentes”, analisa o MP. “Cabe destacar a fragilidade das declarações de Marcelo Traça e de Renato Pereira, as quais, a despeito de revelarem possíveis violações graves ao interesse público, desacompanhadas de outros elementos que as corroborem e esclareçam pontos necessários à individualização das condutas e à demonstração da materialidade e autoria, não configuram sequer indícios mínimos a possibilitar a judicialização do caso com fulcro na Lei de Improbidade Administrativa”, escreve Renata Scarpa.
“Cumpre ressaltar que Marcelo Traça menciona mensagens trocadas pelo aplicativo whatsapp com Domício Mascarenhas e Rodrigo Neves, cujo conteúdo falaria a respeito de questões de interesse das atividades das empresas de transporte rodoviário. Contudo, pela leitura das mensagens percebe- se que as partes tocam em assunto que não se relaciona com eventual esquema ilícito, além de marcarem encontros sem que seja possível identificar o tema que seria abordado, impedindo que este membro ministerial entenda as referidas mensagens como elemento que confirme as declarações dos colaboradores a ensejar indícios de ato de improbidade administrativa. (…) Dessa forma, haja vista a ausência dos requisitos exigidos pelo novo art. 17, parágrafo sexto, da Lei 8.429/1992, percebe-se que a inicial é inepta, vez que não individualiza a conduta com a demonstração de elementos mínimos, tampouco contém indícios suficientes a respeito da veracidade dos fatos e do dolo dos agentes”, complementa o MP.
A promotora Renata Scarpa também analisa o material recolhido durante as ações de busca e apreensão contra os acusados. Ela conclui que não foi produzida nenhuma prova.
“No caso dos autos, a ação penal no 0068811-80.2018.8.19.0000, distribuída em dezembro de 2018, é lastreada pelos mesmos elementos de informação desta ação de improbidade, acrescidos dos registros de busca e apreensão, mandados de arrombamento e de depoimentos colhidos em novas investigações instauradas”, escreve a Promotora. “Saliente-se que os mencionados registros, mandados e depoimentos, juntados no curso do processo, de maneira semelhante aos elementos que instruem ambas as iniciais, não parecem corroborar suficientemente à imputação dos demandados em ato de improbidade administrativa estabelecido no art. 9o, da LIA. Veja-se que os mandados de busca e apreensão e de arrombamento cumpridos nos endereços dos réus registram a apreensão de valores em espécie não expressivos, telefones celulares, notebooks, documentos de identificação, discos rígidos, dentre outros documentos diversos, sem o encontro de itens que de maneira clara validem as informações prestadas pelos colaboradores”.
Descrição Detalhada da decisão:
Processo nº: 0005296-94.2020.8.19.0002
Tipo do Movimento: Recebimento
Vistos etc. Trata-se de Ação Civil Pública de responsabilização objetiva de pessoas jurídicas por atos contra a Administração Pública e atos de improbidade administrativa praticados por pessoas físicas e jurídicas, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO em face de RODRIGO NEVES BARRETO, DOMÍCIO MASCARENHAS DE ANDRADE, JOÃO CARLOS FELIX TEIXEIRA, JOÃO DOS ANJOS SILVA SOARES, CONSÓRCIO TRANSOCEÂNICO, CONSÓRCIO TRANSNIT, AUTO LOTAÇÃO INGÁ LTDA., EXPRESSO BARRETO LTDA., TRANSPORTES PEIXOTO LTDA., AUTO ÔNIBUS BRASÍLIA LTDA., VIAÇÃO ARAÇATUBA LTDA., VIAÇÃO FORTALEZA LTDA., VIAÇÃO PENDOTIBA LTDA., SANTO ANTÔNIO TRANSPORTES LTDA. e EXPRESSO MIRAMAR LTDA., todos já devidamente qualificados nos autos. Decisão concedendo a liminar decretando a indisponibilidade dos bens de RODRIGO NEVES e DOMICIO MASCARENHAS, com fulcro no art. 7º, caput da Lei nº 8.429/1992, bloqueando suas contas bancárias, observando-se as impenhorabilidades previstas em Lei e tornando, ainda, indisponíveis os seus bens móveis e imóveis, até o valor de R$ 10.982.363,93 (dez milhões, novecentos e oitenta e dois mil, trezentos e sessenta e três reais e noventa e três centavos)., tendo sido deferida a utilização do BACENJUD e sistema RENAJUD, às fls. 1808/184, 1816/1818 e 1905/1908. Manifestação Preliminar de Rodrigo Neves Barreto, às fls. 1959/2015. Defesa Prévia das Pessoas Jurídicas VIAÇÃO PENDOTIBA S/A., SANTO ANTÔNIO TRANSPORTE LTDA., EXPRESSO MIRAMAR LTDA., VIAÇÃO FORTALEZA LTDA., que integram o CONSÓRCIO TRANSOCEÂNICO, às fls. 2339/2378. Defesa Prévia das Pessoas Jurídicas VIAÇÃO ARAÇATUBA, EXPRESSO BARRETO, AUTO ÔNIBUS BRASÍLIA, TRANSPORTES PEIXOTO, AUTO LOTAÇÃO INGÁ, e o CONSÓRCIO TRANSNIT, às fls. 2459/2527 e fls. 2596/2670. Acórdão negando provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto por Rodrigo Neves Barreto em face da decisão que deferiu a liminar, às fls. 2758 e seguintes, com trânsito em julgado, conforme fls. 2801. Parecer Ministerial, pugnando pela extinção do feito sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485 e art. 330, do Código de Processo Civil (CPC), c/c art. 17, §6º e §6º-B, da Lei 8.429/1992, às fls. 2806/2823, Diante da manifestação do Ministério Público, foi determinada a manifestação dos réus regularmente constituídos nos autos (fls. 2827), os quais se manifestaram às fls. 2830/2831, 2838, 2841/2843, 2849/2852 e 2854/2855. É a síntese do necessário. Passo a decidir. Na esteira do parecer ministerial de fls. 2806/2823, ressalta-se que o advento da Lei nº 14.230, 25 de outubro de 2021 trouxe alterações normativas que geram impactos sobre a presente demanda. A petição inicial de fls. 03/76, devidamente instruída com o inquérito civil nº 131/18 e documentos de fls. 77/ 1800, imputa aos réus a prática, em tese, de atos de improbidade administrativa capitulados nos artigos 9º, inciso I, e 11, caput e incisos I e II, da Lei 8.429/1992. A lei não só determina a correta identificação das condutas praticadas com incidência em uma das figuras dos artigos 9º, 10 e 11, como também exige a demonstração da presença de justa causa para a ação de improbidade administrativa, sob pena de inépcia da petição inicial e com o fito de evitar demandas sem lastro probatório mínimo. Ademais, com o advento da Lei 14.230/2021, apenas se poderiam buscar elementos para enquadrar as condutas descritas na inicial sobre o art. 9º, da Lei 8.429/1992, porquanto o art. 11 sofreu severas modificações, passando a conter nova redação tipológica, a qual, por opção legislativa, apresenta rol taxativo e revoga as hipóteses dos incisos I, II, IX e X, que deixam de se tratar de ato de improbidade administrativa. O Parquet considera que a exordial se mostra deficiente tanto no aspecto da individualização das condutas, quanto na demonstração da materialidade e dos indícios de autoria, motivo pelo qual haveria impossibilidade de prosseguimento da presente demanda. Sustenta ainda, que inexistem elementos informativos mínimos, seja nestes autos ou no processo criminal correlato, a justificar o prosseguimento desta ação de improbidade. Assim, considerando a impossibilidade de emenda a inicial na hipótese, acolho o parecer ministerial de fls. 2806/2823, para INDEFERIR A INICIAL E JULGAR EXTINTO O FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO com fulcro nos artigos 330 c/c 485, I do Código de Processo Civil c/c art. 17, §6º e §6º-B, da Lei 8.429/1992. Consequentemente revogo a liminar deferida às fls. 1808/1814, que decretou a indisponibilidade dos bens de RODRIGO NEVES e DOMICIO MASCARENHAS, devendo ser adotadas as medidas necessárias para eventual desbloqueio através do sistema SISBAJUD e RENAJUD, bem como expedidos os ofícios para a Delegacia da Receita Federal, Banco Central, Detran, Corregedoria de Justiça do TJ/RJ, Cartórios de Registro de Imóveis do Estado e Capitania dos Portos, comunicando-lhes sobre a revogação da liminar. Sem custas. Certificado o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se. P.R.I.