O golpe parlamentar em curso no Brasil contra o mandato conquistado através do voto popular de mais de 54 milhões de brasileiros será o tema principal do discurso que a presidente Dilma Rousseff fará amanhã (22/4) na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, na cerimônia de assinatura do Acordo de Paris sobre a Mudança do Clima. Dilma anunciou a viagem no último instante e o fato preocupa os principais articuladores do golpe – aliados do vice-presidente Michel Temer (PMDB), que assumirá o poder por três dias.
Dilma nesta quinta para os Estados Unidos onde já se encontra, desde segunda-feira, o senador e presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) – um dos principais articuladores do impeachment. Aloysio está nos EUA para uma série de reuniões com autoridades de lá, mas prefere rotulá-las de “privadas” para evitar o assédio da imprensa, como denunciou o jornalista americano Glenn Greenwald, em matéria publicada esta semana no jornal “The Intercept”.
Segundo Dayane Santos, do portal Vermelho, “enquanto a grande imprensa brasileira tenta dar um verniz legalista ao golpe cometido pela Câmara dos Deputados, a imprensa internacional tem apontado que o pedido de afastamento é exclusivamente político e resultado da polarização”.
Na avaliação da jornalista, a denúncia de Dilma na ONU será importantíssima, dando seguimento, por exemplo, a entrevista coletiva que ela concedeu nesta terça a correspondentes internacionais de 56 países, oportunidade em que afirmou, com todas as letras, que seu vice, Michel Temer “não tem legitimidade” para assumir a presidência no seu lugar e que o processo de impeachment em andamento, agora no Senado, é uma farsa.
“É estarrecedor que um vice-presidente, no exercício do mandato, conspire contra a presidenta abertamente. Em nenhuma democracia do mundo, uma pessoa que fizesse isso seria respeitada”, afirmou Dilma na coletiva aos jornalistas estrangeiros.
Dilma frisou, na entrevista à imprensa estrangeira:
“Há um golpe em curso que usa de uma aparência de processo legal e democrático para perpetrar um crime que é a injustiça. Praticam comigo o jogo do ‘quanto pior, melhor’. Pior para o Brasil, melhor para a oposição. E praticam isso por meio de pautas-bomba. Também me sinto injustiçada por não me permitirem que governasse num clima de estabilidade política. Saio dessa questão dos atos com a consciência tranquila porque pratiquei atos que são praticados por todos os presidentes da República”, frisou Dilma na coletiva.
Publicações estrangeiras como a revista alemã “Der Spiegel”, a inglesa ‘The Economist’, o jornal El País (Espanha), Público (Portugal), The Guardian (Inglaterra), Página 12 (Argentina) e até mesmo a rede de televisão Al-Jazeera, entre outras, estão denunciando a ameaça contra a democracia brasileira, exatamente como aconteceu recentemente na Ucrania, no Paraguai e na Guatemala – em golpes de estado articulados pelos Estados Unidos.
Sob o título “A crise institucional no Brasil: Um golpe frio”, o jornal alemão Der Spiegel disse que a Rede Globo atua em defesa do golpe. “Parte da oposição e da Justiça agem, juntamente com a maior empresa de telecomunicações TV Globo, para estimular uma verdadeira caça às bruxas que tem como alvo o ex-presidente Lula”, disse o jornal.
A declaração da presidenta ganha força junto à população que não apoia o golpe. Nesta terça, um vendedor ambulante que estava em frente ao escritório de Temer em São Paulo, ao avistá-lo, o chamou de “traidor” e “golpista. Temer está em São Paulo se reunindo com seus principais aliados, Moreira Franco e Eliseu Padilha entre eles, para articular a montagem do governo que espera receber – aprovado o afastamento de Dilma da presidência pelo Senado – ainda na primeira quinzena de maio.
Ainda de acordo com o portal Vermelho, Temer vem buscando uma saída “para dar uma fachada legal ao seu governo” e aliados estariam preparando – com a ajuda entre outros de Fernando Henrique Cardoso, de um discurso de posse que terá a preocupação de “camuflar o golpe”.
Entrevistado pela Globo, nos Estados Unidos, Aloysio Nunes Ferreira reagiu à iniciativa de Dilma de denunciar ao mundo o golpe em curso no Brasil argumentando que será nocivo para o país Dilma falar sobre o que está acontecendo no país.
“Espero que ela não faça desta visita plataforma para fazer a campanha que vem fazendo no Brasil e que é profundamente nociva aos interesses do povo brasileiro, porque ela tem dito por aí afora que o Brasil é um país onde não há leis, não há Constituição, há golpe de estado em marcha, uma total falsificação da defesa dela, da realidade da política da democracia brasileira. Eu acho que isso é um desserviço que ela presta ao país, querendo se vitimizar e falsificando a realidade institucional brasileira”, afirmou.
Na mesma linha, provocados pela Rede Globo de Televisão, se manifestaram os ministros do Supremo Gilmar Mendes, Celso de Melo e Dias Toffoli.