Socióloga e cineasta detalha resistência durante produção de documentário na Fundação Roberto Marinho
“Darcy Ribeiro era um nome proibido na Globo”, disse a socióloga e cineasta, Isa Grinspum Ferraz, ao relatar o bloqueio, na década de 80, ao antropólogo e ex-senador do PDT fluminense. Na entrevista para o “Trabalhismo na História”, do Centro de Memória Trabalhista (CMT), ela conta que a resistência foi percebida durante a produção, na Fundação Roberto Marinho, de um documentário sobre educação infantil.
“Não se podia falar o nome. Nem do Chico Buarque, nem do Darcy Ribeiro. […] Tanto eu fiz, que consegui. [Darcy] Ele ficou muito surpreso, achou que era trote”, contou, detalhando a marcante entrevista que “não pôde usar”.
Ao longo da conversa com Henrique Matthiesen, Isa contou que recebeu, posteriormente, o convite do pedetista para trabalhar em projetos audiovisuais, como o curso de formação de professores. A relação profissional durou mais de uma década e foi até o seu falecimento, em 1997.
“Ele estava sempre inventando, criando e pensando no país, na educação e nos índios. Pensava no povo brasileiro o tempo todo, […] escrevia o dia inteiro. Era um homem de ação, além de pensamento”, ressaltou.
Produtora do documentário sobre a obra “O Povo Brasileiro”, que foi roteirizado pelo próprio Darcy em 97, Isa revela o impacto do conteúdo desde o primeiro contato. Para ela, o professor mineiro se diferenciava pela “liberdade de trabalhar com figuras da história e fluência do texto”.
“Quando ele [Darcy] terminou, mandou o original para alguns amigos e para mim. Quando eu li, eu fiquei impressionadíssima com a originalidade do pensamento dele, com a maneira dele contar essa história. A liberdade de trabalhar com figuras da história e a fluência do texto.
Para estimulá-lo, apesar da saúde debilitada, a cineasta conta que utilizou uma palavra determinante para o convencimento: educação.
“Para botar nas escolas públicas, Darcy. Vamos fazer uma série e ele topou”, afirmou, diante da saúde debilitada do antropólogo, que lutava contra o câncer, e a limitação financeira para a gravação, que durou cinco dias em Maricá.
Após a captação de recursos via leis de incentivo, Isa complementou o documentário com gravações por diversos estados do Brasil, que foi finalizado, no final de 99, exibido em canais de televisão abertos e fechados, bem como premiado em festivais.
Cenas revolucionárias
Ao relatar o “profundo amor e orgulho” pela trajetória do seu tio, o ex-deputado federal Carlos Marighella, Isa abordou ainda toda a dificuldade imposta pela “terrível” ditadura militar aos seus familiares desde o golpe, passando pela morte do líder político, em novembro de 1969, e até a anistia, em 1979.
“Marighella foi considerado o inimigo número um da ditadura brasileira. […] Foi muito duro porque ele foi assinado e minha tia [Clara Charf] foi para o exílio. Depois da morte do meu tio, meu pai foi preso, no DOI-CODI [Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna], para ser torturado, pois queriam saber onde estava minha tia”, detalhou.
“História pesada, ao mesmo tempo de muito orgulho, de ter esse privilégio de viver e compartilhar a minha infância com pessoas tão legais”, completou, com referência ao longa-metragem documental “Marighella”, que foi lançado em 2011.
Confira a entevista na íntegra: