A conversa gravada de Sérgio Machado, um dos operadores do PMDB da corrupção na Petrobrás, com Romero Jucá, senador do PMDB e Ministro-usurpador do Planejamento do governo usurpador Michel Temer, é mais que estarrecedora; é sobretudo esclarecedora. O conteúdo desta conversa serve como autópsia do golpe de Estado em andamento no Brasil.
O diálogo confirma as suspeitas de que a Lava Jato foi instrumentalizada para criminalizar o PT e desestabilizar o governo Dilma. E desvenda, também, porque o impeachment não passa de uma armação fraudulenta para derrubar a Presidente Dilma para, a partir do golpe, acomodar no Poder as forças políticas que se unem para pôr fim à Lava Jato.
A conversa dos delinqüentes é de março de 2016, portanto ainda durante a tramitação da farsa do impeachment na Câmara, e pelo menos três semanas antes do deplorável 17 de abril, dia da votação do processo pela “assembléia geral de bandidos comandada por um bandido chamado Eduardo Cunha”, como reporta a imprensa internacional.
Diante dessa cronologia dos acontecimentos, Rodrigo Janot e Sérgio Moro têm a obrigação legal de revelar à sociedade brasileira desde quando tinham posse dessa gravação, e porque não agiram tempestivamente diante do crime em flagrante cometido pelos delinqüentes. Enquanto isso não for esclarecido, uma densa nuvem de suspeitas pesará sobre eles.
Nesta circunstância de brutal ameaça à democracia, a sociedade brasileira tem o direito de exercer o controle público sobre as instituições de Estado. Esta hora impõe absoluta transparência a respeito das investigações em andamento, bem como do nome de todos os implicados que não podem exercer funções públicas e, também, quanto ao timing e à oportunidade escolhida pela força-tarefa para a divulgação de fatos da Lava Jato.
Não pode se fazer profecia do passado, mas se o conteúdo desta conversa tivesse sido revelado oportunamente pela força-tarefa da Lava Jato ainda em março, é crível supor que a farsa doimpeachment teria sido abortada e o golpe de Estado teria sido interrompido.
Romero Jucá, assim como Delcídio Amaral, é um elo da cadeia histórica de corrupção que atua na Petrobrás desde o governo FHC. Não por acaso esta raposa política conseguiu o milagre de estar na liderança de todos os governos nos últimos 22 anos – FHC, Lula, Dilma e agora no governo usurpador. Tal “versatilidade” ideológica serviu-lhe para cuidar das negociatas e roubalheiras do PMDB, PSDB, dos partidos satélites e dele próprio.
O conteúdo da conversa de Jucá com seu sócio de crime fornece importantes elementos para a autopsia do golpe:
- o impeachmentda Presidente sem nenhuma acusação ou imputação de crime, é a moeda de troca para livrar a cara dos verdadeiros bandidos:
– Jucá: “Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá. Não adianta esse projeto de mandar o Lula para cá ser ministro. … Tem que ter impeachment. Não tem saída. … Tem que resolver essa porra… Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria”.
– Sérgio M.: “Eu acho o seguinte, a saída [para Dilma] é ou licença ou renúncia. A licença é mais suave. O Michel forma um governo de união nacional, faz um grande acordo, protege o Lula, protege todo mundo. Esse país volta à calma, ninguém agüenta mais”.
2.o governo golpista, integrado pelos partidos implicados na Lava Jato, faz parte do acerto para encerrar a Operação:
– Sérgio M.: “Rapaz, a solução mais fácil era botar o Michel [Temer]. … Botar o Michel, num grande acordo nacional”.
– Jucá: “Com o Supremo, com tudo”.
– Sérgio M.: “Com tudo, aí parava tudo”.
– Jucá: “É. Delimitava onde está, pronto”.
– Jucá: “[Em voz baixa] Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem ‘ó, só tem condições de [inaudível] sem ela [Dilma]. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca’. Entendeu? Então… Estou conversando com os generais, comandantes militares. Está tudo tranqüilo, os caras dizem que vão garantir”.
- os centros de execução do golpe adotam uma linha meticulosa de operação:
– Sérgio M.: “Essa cagada desses procuradores de SP [controlados pelo PSDB] ajudou muito” [segundo a FSP, se trata de possível alusão ao pedido de prisão de Lula pelo MP/SP devido ao apartamento de Guarujá].
– Jucá: “Os caras fizeram para poder inviabilizar ele [Lula] de ir para um ministério. Agora vira obstrução da Justiça, não está deixando o cara, entendeu? Foi um ato violento…” – aqui a referência é ao pretexto criado pelo MP/SP e usado pelo Gilmar Mendes, do STF, para impedir Lula de assumir a Casa Civil.
- a Lava Jato é direcionada e seleciona como alvo o PT, apesar que somente 2 dentre os 105 condenados na Operação sejam identificados com o PT:
– Jucá: “O Marcelo e a Odebrecht vão fazer [delação]. … Seletiva, mas vai fazer”.
- a sociedade de governo entre Temer e Cunha é parte da estratégia para ganhar tempo para a travessia em direção à impunidade. Cabe lembrar que Cunha indicou vários operadores para postos-chave do governo usurpador [Casa Civil, AGU, Justiça etc]:
– Sérgio M.: o Renan “ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele”.
– Jucá: “Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem”.
- a Lava Jato protege os tucanos:
– Sérgio M.: “O Aécio, rapaz… O Aécio não tem condição, a gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem não conhece o esquema do Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB…”.
– Jucá: “É, a gente viveu tudo”.
Se uma revelação desta gravidade fosse feita no governo Dilma, o país amanheceria virado de pernas para o ar, com o noticiário exclusivo sobre o escândalo nas 24 horas do dia, com um clima de fim de mundo e pedidos de impedimento – quando não de prisão – dos envolvidos, inclusive do golpista Michel Temer, que apesar de citado em diversas listas de corrupção, ainda preside o governo usurpador e nomeia ministros encalacrados em escândalos de corrupção e réus por diversos crimes.
(*) Jeferson Miola é militante do PT e foi coordenador do 5° Forum Social Mundial