Lula falou aos conselheiros do CDES e aos participantes do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento que reuniu intelectuais, lideranças políticas, lideranças sociais e empresariais do Brasil e do exterior nos dias 5 e 6/3, em Brasília, para discutir os desafios do Estado diante da crise. O evento, com vasto programa de palestras e debates, reuniu autoridades brasileiras e estrangeiras.
Lula, depois do discurso escrito, falou de improviso. Segundo ele, houve durante duas décadas quase uma apatia porque as pessoas se elegeram sob a égide de que o Estado não valia nada, de que o mercado resolveria tudo e que o papel do governante era enxugar o Estado, diminuí-lo o máximo possível para não atrapalhar o desenvolvimento da economia e muitos dirigentes passaram o mandato inteiro fazendo isso, alfinetou.
Em seguida, elogiou aos que resistiram: É preciso reconhecer o papel de todos que resistiram à agenda do estado mínimo nos últimos 20 anos; dos que resistiram ao desmonte das políticas públicas em nome da desregulamentação; dos que resistiram a idéia de entregar a sociedade aos azares do cassino financeiro. A crise consolida e consagra uma agenda de desenvolvimento que vinha sendo criticada de forma injusta e agressiva nos últimos anos. Se alguém ainda tem dúvida sobre a mudança em curso, recomendo a leitura do orçamento anunciado pelo presidente Obama na semana passada, disse.
O que percebemos é que o mundo ficou subordinado a uma especulação financeira sem precedentes na nossa história. Ninguém sabe até hoje quantos trilhões de dólares atravessavam os oceanos, sem passaporte, sem nada. E depois da crise a gente percebe que os dólares que sobrevoavam desapareceram. Não existe outra explicação a não ser de que o sistema financeiro esteve totalmente divorciado do setor produtivo das nações, ressaltou.
Para Lula, a crise chamou a atenção para a necessidade de o Estado promover o desenvolvimento através de investimentos públicos. Disse também que não vai permitir que os trabalhadores paguem com seus salários a crise, ainda mais depois das empresas acumularem grandes lucros por tantos anos.
Não me peçam para que os trabalhadores paguem a crise outra vez, via arrocho salarial. Não me peçam porque estou convencido de que a nossa teoria estava correta. Quando diziam que a riqueza só poderia ser distribuída no Brasil quando o país crescesse – ficamos esperando crescer 30 anos e o país cresceu. Alguns poucos ficaram com tudo e nós ficamos sem nada. Naquele tempo já dizíamos que era necessário distribuir para a economia crescer.
Por isso não temos medo de dizer, em alto e bom som, que tudo o que tem que acontecer com essa crise, não é o presidente da República se trancar no seu gabinete, os ministros resolverem fazer contingenciamento cada vez maior, cada vez gastar menos, cortando salários, para tentar vencer a crise. Não. Vamos vencer essa crise com investimento, com ousadia, com coragem, disponibilizando crédito para fazer este país crescer. É preciso estabelecer nova lógica nas relações comerciais. Por que o dólar tem que ser a moeda de troca com a Bolívia, com a Argentina, com o Paraguai, com a China? Por que não promover trocas com as moedas de nossos países? Por que tenho de me subordinar a isso (dólar)?
Lula destacou as ações positivas do governo que permitiram uma melhor situação econômica para enfrentar a turbulência dos dias de hoje. Disse não se tratar de um desafio estranho ao governo: Desde 2003, lutamos com cautela, mas com firmeza, para livrar a economia brasileira de uma inserção dependente e subordinada à lógica financeira internacional.
Segundo Lula, hoje o Brasil não depende de dinheiro externo para preservar seu crescimento em meio a crise mundial equivalente, ou até mais grave, que a de 1929. Essa conquista, acrescentou, deve ser creditada ao conjunto de políticas e decisões estratégicas tomadas pelo seu governo nos últimos anos voltadas para a construção de um mercado de massas.
Foram decisivas as políticas sociais, bem como a recuperação do poder de compra do salário mínimo que cresceu 51% em termos reais de 2003 até agora. Mais de 20 milhões de brasileiros e de brasileiras saíram da base da pirâmide de renda nos últimos anos ampliando as faixas médias de consumo do mercado interno, disse.
Lula concluiu: Espero que isso sirva de lição para todos nós e que a gente, daqui para a frente, tenha em conta que qualquer política econômica só será séria se for subordinada à produção, à geração de empregos e à distribuição de renda.
MARIA DA CONCEIÇÃO TAVARES – A professora Maria da Conceição Tavares, no tom que lhe é peculiar, disse que o Banco Central continua sendo um feudo inimigo do país. Após ser provocada pelo conselheiro e ex-governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto sobre as taxas de juros,ela afirmou: Ninguém, nenhum país, está mantendo taxas de juros absurdas. O que atrasa é que no Brasil temos duas nações: uma amiga, a Petrobras e um feudo inimigo, o Banco Central.
No mesmo seminário, o conselheiro da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Untacd) afirmou que as condições que beneficiaram a economia brasileira não voltarão a se repetir, o que poderá trazer dificuldades para o Brasil a médio prazo. Kregel disse que o novo cenário imporá desafios para o país a médio e longo prazo.
Para o professor, as autoridades econômicas brasileiras não podem confiar que o país será pouco atingido pela crise, como recentemente fizeram o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o próprio presidente Lula, quando classificou a crise de marolinha no Brasil.
O boom no preço das commodities e o fluxo de investimentos externos, que beneficiaram o país nos últimos anos, não voltarão mais, destacou Kregel.
Na opinião dele o Brasil precisa investir a longo prazo na rede de proteção social e na educação, para manter o desenvolvimento nas próximas décadas.
Não adianta confiar no BNDES para financiar as empresas e segurar a economia eternamente porque esse modelo não é sustentável, declarou. Segundo ele, o governo não tem condições de se financiar, por muitos anos, pegando dinheiro dos investidores com juros altos:
O governo não pode financiar os inestidores co taxas de retorno elevadas por tampo tempo. Isso é difícil de se manter no longo prazo, advertiu.
Já o presidente do BNDES,Luciano Coutinho, também presente ao seminário, afirmou que, na sua opinião ao contrário de outras autoridades governamentais, é irreal a expectativa de que a economia mundial pode começar a se recuperar a partir do segundo semestre de 2009.
Essa crise é gravíssima e se estenderá por três ou quatro anos. Teremos um longo período de estagnação. Não parece crível qu poderemos ter uma recuperação no 2º semestre. Isso me parece muito irrealista. Como estudioso de História, acredito que essa crise se prolongará com crescimento negativo mundial, principalmente nas economias desenvolvidas. Estamos vendo os primeiros capítulos de uma grande e longa crise.
DILMA ROUSSEF – PAC É ESTRATÉGICO – Após apresentar uma síntese dos avanços econômicos no governo Lula, na sua opinião, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, afirmou que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não é um projeto isolado, uma lista de obras isoladas, um plano de marketing, mas peça central da nova política de desenvolvimento que coloca o estado brasileiro como principal indutor do crescimento.
Segundo a ministra, em vez de se cortar investimentos, como se fez no passado, o governo tem consciência de que é preciso investir para promover o desenvolvimento.
A ministra lembrou que quando Lula assumiu em 2003, uma comissão do FMI veio ao país para fiscalizar e determinar o que se podia ou não fazer. Para investimentos em saneamento básico, por exemplo, eles aceitavam um investimento de R$ 500 milhões. Hoje estamos investindo R$ 40 bilhões em saneamento, exemplificou.
Dilma destacou a importância de o país fomentar um mercado interno de massas, fato que na sua opinião hoje nos permite minimizar os efeitos da queda do comércio internacional. Ela citou inúmeras frentes de investimentos em infraestrutura do país, especificamente para melhoria dos transportes rodoviário, ferroviário e hidroviário; além de investimentos feitos nos setores de energia, saneamento básico, petróleo e biocombustíveis, entre outros.
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