O presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara, deputado Vieira da Cunha ( PDT -RS), disse ontem que vai convocar o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, para explicar o impacto do avanço de empresas e pessoas físicas estrangeiras na compra de terras e a falta de mecanismos de controle governamental, mostrados em reportagem
do Jornal do Brasil de ontem. Vieira afirma que o assunto ganhará prioridade na pauta da comissão e será tema da audiência pública com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, convidado para falar sobre soberania e segurança nacional no próximo mês.
Segundo o deputado, dependendo das explicações oficiais, ele poderá pedir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar quem são os estrangeiros e qual a dimensão de terras nas mão deles.
Todo capital estrangeiro é bem vindo, desde que se tenha controle sobre ele – disse o deputado. – Não se trata de xenofobia, mas de soberania. O Brasil não está e nem pode estar à venda. Muito menos pode se transformar numa grande imobiliária. O que está acontecendo no meio rural é de extrema relevância e será demanda prioritária na comissão.
Para o parlamentar, a falta de controle implica riscos tão complexos que negócios aparentemente normais podem esconder interesses escusos de toda ordem.
– O governo precisa tomar atitude, criar regras para a aquisição de terras por estrangeiros disse.
Preocupado com a voracidade do capital estrangeiro e do impacto que as transações de terra está provocando na reforma agrária, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) anunciou que vai intensificar as ações de protesto.
– Exigimos que o governo crie portaria que impeça que empresas estrangeiras comprem terras no Brasil, pois esses processos de monocultura aumentam a pobreza no campo, comprometem a terra, água, biodiversidade e a soberania do país -informou, em nota ao JB, o principal dirigente do movimento, o economista João Pedro Stédile. Outro coordenador nacional, João Batista de Oliveira, disse que as multinacionais vêm promovendo uma espécie de “desterritorialização sutil do Brasil” através da compra de terras.
– É um absurdo que em plena era da informática e da tecnologia o Incra não tenha o controle. Já vínhamos denunciando isso, mas vamos agora intensificar o debate e acordar a sociedade para o que está acontecendo – afirmou Oliveira.
O MST, segundo o dirigente, não está preocupado com a questão por corporativismo, mas porque “a volúpia do lucro”, gerada com a corrida em busca do etanol como nova matriz energética, destruirá os recursos naturais do país.
– Comprar nossas próprias terras é o cúmulo, mas está na lógica das privatizações. Mais sério do que perdas na reforma agrária é o risco de permitir a monocultura da comida. Estamos voltando aos tempos da velha colônia – criticou Oliveira.
Embora os únicos dados que o governo brasileiro disponha, retirados do cadastro do Incra, mostrem que os imóveis em nome de estrangeiros no Brasil somem 33.233 – 31.194 em nome de pessoas físicas e outros 2.039 de empresas – um balanço do Banco Central sobre os investimentos estrangeiros com a perspectiva de desenvolver a indústria de etanol no Brasil pode ilustrar o boom imobiliário rural. Nos três primeiros meses deste ano o volume de recursos aumentou 66% em relação ao mesmo período de 2006. Entre janeiro e março, os estrangeiros injetaram R$ 6,5 bilhões na economia brasileira, a maior parte de origem norte-americana. O aumento tem explicação na meta anunciada pelo governo daquele país de reduzir em 20% até 2017 o consumo de combustíveis fósseis e aumentar o de biocombustíveis. A projeção é de que o Brasil forneça grande parte do etanol que os EUA precisará. –
JB