As urnas eletrônicas desreguladas também atrapalharam a eleição. Algumas não respeitam a vontade do eleitor. Se ele escolhe Barack Obama na tela, o voto vai para John McCain. O aviso é: cuidado na hora de confirmar o voto. Muitos estados já desistiram do equipamento e trocaram pela cédula de papel.
Essa notícia foi dada, ainda que rapidamente, no Jornal Nacional de ontem. Pode ser lida aqui.
É estranho. Num país de tecnologia avançada, fabricante de urnas eletrônicas – inclusive das utilizadas nas eleições brasileiras – comprova-se, ou descobre-se, que elas não são seguras. Nem vou querer discutir as causas do erro, se fruto de boa ou de má fé. O importante é que, definitivamente, as urnas eletrônicas não são totalmente confiáveis.
Mas aqui não é assim. Aqui as urnas eletrônicas são seguras e indevassáveis. Não há a mínima possibilidade de ocorrerem erros e fraudes – pelo que dizem as autoridades eleitorais. Tanto que sequer se habilita a impressão do voto para corrigir eventuais erros e possibilitar recontagens e revisões. Isto impede a ação impugnativa dos partidos.
Parte-se do pressuposto da absoluta segurança da urna-e porque ministros do TSE e desembargadores dos TREs as abençoaram. Mas eles não têm conhecimento profundo de Informática; pelo contrário, louvam-se, em suas certezas, na palavra de técnicos. O problema é que nos acostumamos a endeusar quem ostenta um cargo, meritório, por certo, mas que nem por isto lhe dá o dom da onisciência.
Somos amestrados a aceitar tudo, principalmente o que é defendido por uma autoridade mais graduada. Importa apenas o que está escrito. Os EUA formaram-se através de pequenas insurreições civis. A desobediência civil é, muita vez, salutar. Menos no Brasil.
No caso da urna-e os prejudicados somos os eleitores que a cada eleição temos que engolir o dogma da presunção de segurança total delas quando isto é utopia. A Imprensa, que também não conhece o assunto com a profundidade que deveria, apenas dá notícias, como a transcrita, sequer cogitando a possibilidade de que o mesmo possa ter ocorrido nas últimas eleições, aqui, há menos de um mês, debaixo de nossos nasais.
O pior é o TSE não admitir uma auditoria independente na urna-e. Permitir, mas fazer exigências absurdas, inclusive financeiras, de modo a complicar definitivamente a ação, é o mesmo que negar.
Está no site Voto Seguro, em TSE impede Teste de Penetração nas urnas-e: Em 08 de junho de 2006, o Partido dos Trabalhadores, PT, e o Partido Democrático Trabalhista, PDT, apresentaram a Petição Conjunta PET TSE nº 1896/2006, solicitando ao TSE permissão para efetuar testes de vulnerabilidades contra ataques nas urnas eletrônicas, também chamados de testes de penetração. Veja a tramitação e o resultado…
Não sei em que medo essas autoridades se apegam para negar o que deveria ser considerado um ato normal e comum, fruto da liberdade de investigação e do direito à informação.
As nossas urnas-e vêm dos EUA. Aqui elas recebem uma blindagem incomum, e na qual nem os próprios fabricantes acreditam. Uma blindagem imposta à força, que não admite discussões, própria daqueles que defendem argumentos sem tê-los e que, para não ter que explicar-se, valem-se do escudo impenetrável da teimosia.
Faz parte da hombridade dos grandes reconhecer erros e procurar evitá-los. Integra a consciência coletiva das grandes nações a busca de eleições limpas e claras, embora isto nem sempre seja possível.
O Brasil está longe de ser uma grande nação. Aqui, tudo se resolve na base do jeitinho, da dissimulação, das afirmativas bombásticas da verdade que pode conter mentiras.
Ilton Dellandréa é juiz no Rio Grande do Sul