As vitórias do PDT na Justiça e o AI-5 do Bolsonaro

Foto: Max Monjardim

Por José Augusto Ribeiro
21/04/2020

Foram duas grandes vitórias, quase simultâneas. Uma foi na primeira instância, a liminar concedida pelo juiz Renato Borelli, de Brasília, na ação popular de iniciativa do Presidente do PDT, Carlos Lupi, para proibir os bancos de cobrarem juros extorsivos (mais de 2% ao mês) sobre empréstimos com base na liberação de recursos decidida pelo Banco Central para aliviar a vida de empresas e pessoas. A outra foi no plenário do Supremo no julgamento da ação de inconstitucionalidade contra a medida provisória do Bolsonaro que pretendia impedir governos estaduais e prefeituras municipais de adotar medidas de distanciamento social para conter a expansão do coronavírus.

A decisão contra os bancos

Os bancos, com a inconsciência, a indiferença e a ganância de sempre, aproveitavam o desastre econômico produzido pelo coronavírus, para lucrar ainda mais, para extorquir dinheiro de seus clientes, mesmo que fossem empresas de cuja salvação depende a sobrevivência do próprio sistema bancário. Nisso agiam com a mesma credulidade da pobre Rainha Maria Antonieta, na Revolução Francesa, perguntando sobre os protestos populares à porta de seu palácio: “Se os pobres não têm pão, por que não comem brioches?”

A ação popular de Lupi vai, naturalmente, ser objeto de recursos, a liminar pode ser cassada, a ação pode chegar ao Supremo e o Supremo já não se mostra dividido, como nos casos ligados à Lava Jato, mas firme em posições de defesa do interesse público na situação de emergência criada pelo Coronavírus.

Os bancos, estes, não acompanham sequer o noticiário de jornais como o “conservadoríssimo” Financial Times, porta voz da finança internacional, que já proclamou o colapso do paradigma neoliberal diante da devastação econômica espalhada pela pandemia. Ou como o Guardian, com sede em Londres e 8 milhões de leitores de suas edições digitais em praticamente todos ou talvez todos os países do mundo.

O Guardian analisou há dias a possível evolução da linha política do Partido Conservador britânico, o partido do Primeiro-Ministro Boris Johnson, que teve a Covid-19 e se tratou e curou num dos hospitais públicos do Serviço Nacional de Saúde, o SUS de lá, que antes ele queria privatizar. Nessa análise, o Guardian escreveu:
— Enquanto a pandemia e o lockdown (o fechamento da economia) avançam, a posição oficial do Partido Conservador é assegurar a menos pior de todas as possibilidades. Essa política pode ser resumida pelo comentário de Rishi Sunak esta semana: “A coisa mais importante que podemos fazer pela saúde de nossa economia é proteger a saúde de nosso povo. Não se trata de escolher entre a economia e a saúde pública.”.

Ao contrário do que poderia parecer, Rishi Sunak não é nenhum refugiado ou imigrante indiano. Ele nasceu na Inglaterra, de uma família indiana do Punjab, e é nada menos que Chanceler do Exchequer, isto é, Ministro da Economia do Boris, e figura importante do Partido Conservador – é o Paulo Guedes deles, mas já curou o pileque e a ressaca do neoliberalismo.

Ouviu, Paulo Guedes? Quem disso foi o Ministro da Economia do Boris Johnson: “A coisa mais importante que podemos fazer pela saúde de nossa economia é proteger a saúde de nosso povo. Não se trata de escolher entre a economia e a saúde pública.”

A propósito, Brizola tinha uma definição de pontaria absoluta. O neoliberalismo, dizia ele, é o revide dos medíocres. Perfeito, não é?

No Brasil, os bancos agiram com esperteza – e a esperteza, como dizia o vice-presidente Aureliano Chaves, pode crescer, virar bicho e comer o esperto. O governo e o Banco Central deveriam ter impedido os bancos de cobrar os juros que cobraram, mas o governo e o Banco Central são na verdade agentes dóceis e obedientes dos bancos.
Felizmente o Lupi foi rápido e conseguiu a liminar contra os bancos e por mais que apareçam recursos, que ela seja cassada e o caso se prolongue, já temos um fato consumado e abertos os olhos da opinião pública e de um empresariado que já não pode submeter-se à tirania dos bancos porque passou a lutar pela própria sobrevivência.

A decisão do Supremo contra  o AI-5 de Bolsonaro
Da outra grande vitória do PDT na Justiça, a decisão do Supremo contra a medida provisória que pretendia amarrar Estados e municípios a decisões do governo federal, podemos dizer que ela enterrou a tentativa do Bolsonaro de impor ao País uma espécie de novo AI-5, ou mini AI-5 que coubesse na moldura constitucional, já que os comandos militares não se mostraram dispostos até agora a promover a intervenção cobrada pela franja lunática do bolsonarismo.

Com sua medida provisória, Bolsonaro queria anular a competência concorrente dos Estados e municípios para adotar medidas de defesa da saúde pública contra o Coronavírus. E a maioria do Supremo decidiu que os Estados e os municípios podem adotar essas medidas, tanto quanto a União, e que o governo federal não pode superpor os seus desejos a essas medidas.

Sem a decisão do Supremo, Bolsonaro poderia tomar decisões que ameaçariam ou liquidariam as medidas de cautela adotadas pelos Estados e pelos municípios, acabaria com a autonomia dos estados e municípios – sobretudo os do Nordeste, todos de esquerda, e de São Paulo e do Rio, ambos de direita, mas radicalmente rompidos com Bolsonaro.
Senhor da questão do Coronavírus, Bolsonaro teria nas mãos o AI-5 possível a ele, já que até agora os comandos militares não tomaram conhecimento dos apelos pela intervenção das Forças Armadas contra o Congresso e o Supremo.

Ainda neste domingo, aliás, participantes das manifestações bolsonaristas pediam a Bolsonaro a decretação de um novo AI-5, evidentemente para fechar o Congresso e o Supremo. No sábado, numa aglomeração diante do Palácio do Planalto, Bolsonaro apontava impotente para o edifício do Supremo, culpando-o pelo que puder acontecer.

A tentativa é clara: mobilizar grandes manifestações populares que provoquem um impasse institucional. Só que as manifestações de domingo foram insignificantes e os manifestantes estão longe do AI-5 que pediam. E, graças à iniciativa do PDT, o mini AI-5 tentado por Bolsonaro foi derrubado pelo poder desarmado do Supremo.