29 de janeiro: “Dia da Visibilidade Trans”, que permanecem invisíveis


Por Amanda Anderson
29/01/2018

Das lutas ao dia da visibilidade de pessoas travestis e transexuais muito se tem a relatar, mas pontual se faz lembrar o porquê dessa data ser lembrada, O dia foi escolhido em 2004, quando, pela primeira vez na historia do país, travestis e transexuais estiveram no Congresso Nacional, para falar aos parlamentares sobre si, transpondo o estigma da prostituição, à qual muitas são levadas como meio de subsistência pela sociedade “cis-hetero-normativa”, mostrando de fato sua presença na sociedade e que eram dignas de ser tratadas como cidadãs.

Vale ainda ressaltar que muitas foram aquelas que lutaram para que essa inserção e reconhecimento acontecesse: a artista Rogéria, que ficou famosa por suas apresentações no teatro e televisão, Claudia Wonder, cantora de rock na década de 80, Phedra de Córdoba, que se apresenta no grupo brasileiro “Satyros”, Nana Voguel, a “eterna miss”, Lívia Mendonça, a travesti cantora do “Ídolos”, Paula Sabatine, Divina Aloma, Marcinha do Corintho, Weluma Brow, a única chacrete travesti, que lutou contra a ditadura civil-militar e minha amiga pessoal, da qual guardo imensas recordações e relatos dos tempos sombrios para nossos pares no Brasil, entre tantas outras que lutaram e ainda lutam por visibilidade.

É fácil, quando não se vive na pele que habitamos, ler e fazer comparações sobre o dia de hoje, esquecendo-se da representatividade que essa data de fato possui para aquelas que ainda sofrem na pele o desrespeito e desprezo social, vivendo na invisibilidade e marginalização, tendo cerca de 90% de sua população como meio de subsistência a prostituição, invisíveis pelas madrugadas, escondidas na sociedade por sua condição.

Mesmo buscando visibilidade, pouco temos do que nos orgulhar, já que ainda nosso reconhecimento como seres sociais não fora efetivo e sobrevivemos em sociedade com parcos avanços – dados como concessões e/ou vistas de benefícios – mas ainda seguimos lutando. Importante lembrar que o Brasil continua no ranking mundial de países que mais assassinam pessoas travestis e transexuais, estando como primeiro colocado por 7 anos consecutivos, números esses que não assustam àquelas que conhecem e vivenciam a discriminação e o preconceito todos os dias.

Assassinar não é apenas tirar a vida com uma arma de fogo, pedaço de pau, armas brancas ou afins, mas também desrespeitar a identidade de gênero dessas pessoas significa matá-les aos poucos, todos os dias. Quando nos referimos de maneira jocosa ou incorreta, denominando A travesti por o ou O homem transexual por a, não respeitando o nome no qual essa pessoa – travesti ou transexual – se identifica, também aí cometemos assassinato – podendo ser considerado o mais cruel de todos – assassinamos sua identidade, seu ser, sua essência e sua humanidade, o que pode gerar uma ferida psicológica incurável, tão dolorosa. Causa esta que leva muites ao suicídio.

Essa modalidade de assassinato social continua ocorrendo todos os dias na vida dessa população, pela família, amigos, mercado de trabalho, ambiente escolar, social e, consequentemente, a marginalização desses indivíduos que deveriam ser visíveis, mas permanecem invisíveis em nossa sociedade, continuando com nossa expectativa de vida em 35 anos, quando da população brasileira é de 70 anos.

Temos sim coisas a comemorar, mas devemos existir, não mais subsistir. Termos nossos direitos garantidos como os de qualquer cidadão, o direito de ser quem somos e respeitades como tais. Mas resiliência faz parte de nossa história e esta tatuada em nossa pele, vestidas de salto alto ou gravata, quebrando as regras sociais conservadoras dominantes, destoando da bilogia heteronormativa e seguindo, militando para que esse “Dia da Visibilidade Trans” seja de fato um dia que possamos comemorar os nossos direitos, sem distinção, de sermos quem somos, com respeitabilidade e igualdade social.

 

 

*Amanda Anderson é mulher transexual, presidente nacional do PDT Diversidade, primeira transexual Vice Presidente MT/MS da União Nacional dos Estudantes, bacharel em Secretariado Executivo Bilingue e Direito, integrante da RedeTrans Brasil, ex Conselheira da Diversidade Sexual do Mato Grosso do Sul (MS), ex Assistente Jurídica do Centro de Referências em Direitos Humanos de Prevenção e Combate à Homofobia do MS, além de primeira transexual a comandar um movimento partidário da América Latina.