COP 26 e Projeto Nacional de Desenvolvimento Sustentável


Por Everton Gomes 
12/11/2021
É preciso discutir como o País lidará com os impactos econômicos e sociais decorrentes das mudanças climáticas que afetarão muitos setores estratégicos
Líderes de todo mundo debatem sobre nosso futuro climático na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 26). Na ocasião, os países reúnem-se com o propósito de debater a redução de emissão de gases do efeito estufa, embasados nos mais recentes dados científicos que monitoram os impactos atuais e futuros do aquecimento global.

Os participantes do encontro precisam ser cobrados por mobilização mais contundente contra as mudanças climáticas e por colocar em prática estratégias desenhadas no histórico Acordo de Paris, de 2015. O acordo definiu como imperativo limitar o aumento de temperatura do planeta em 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais.

A publicação norteadora da conferência será o último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão que compila estudos sobre o tema para a ONU. Segundo ele, os esforços para não ultrapassar o aquecimento médio do planeta definido pelo Acordo de Paris se tornaram impossíveis. Em todos os cenários, a marca de 1,5 ºC, limite mais ambicioso do Acordo, deve ser ultrapassada entre 2021 e 2040.

As mudanças climáticas afetarão muitos setores estratégicos do Brasil. É preciso discutir como o país lidará com esses impactos econômicos e sociais, e qual será a alocação de recursos para resolver as deficiências já existentes, como a segurança energética, hídrica e alimentar. São todas discussões de médio a longo prazo.

Pela primeira vez, o IPCC traçou um mapa geográfico de riscos com os efeitos extremos, e apontou o Nordeste brasileiro como alvo de tais alterações. Algumas regiões semiáridas e a chamada Região da Monção da América do Sul, que compreende parte do Centro-Oeste brasileiro, da Amazônia, da Bolívia e do Peru, deverão ter os maiores aumentos de temperatura nos dias mais quentes do ano – até duas vezes mais que a taxa de aquecimento global. Com uma estação mais prolongada e maior demora para entrada do período chuvoso há um impacto direto sobre a atividade econômica principal na região, a agricultura. O relatório do IPCC mostra que, nos piores cenários, a plantação de milho e soja ficará inviabilizada em estados como Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Nos últimos anos, o Brasil tem sido cobrado publicamente por líderes mundiais, empresas e até fundos de investimento acerca do aumento do aumento no desmatamento e queimadas na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal. A ausência do Presidente Bolsonaro na COP 26 reforça simbolicamente a falta de compromisso com a luta pela transformação.

O Brasil que, até poucos anos atrás, exercia protagonismo nesse tema fundamental do novo século, está perdendo uma grande oportunidade de liderar esse processo de mudança. Nossa imagem sofreu muito desgaste quando o tema é sustentabilidade. Segundo um levantamento divulgado pelo Observatório do Clima, em 2020 foram emitidos 728 milhões de toneladas de CO2 apenas em decorrência das intervenções humanas no solo amazônico.

Entre a implementação da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), em 2009, e o ano de 2020, o desmate acumulado foi 176% maior do que a meta estipulada originalmente. Os dados dos anos mais recentes também mostram uma tendência de aumento na devastação da maior floresta tropical do mundo. Entre agosto de 2019 e julho de 2020, segundo dados do Inpe, a Amazônia brasileira perdeu 11.088 km² quadrados de área, o número mais alto dos últimos 12 anos.

Existe uma corrida em curso para uma economia com baixa emissão de gases do efeito estufa, e o Brasil é uma potência ambiental. Precisamos encontrar caminhos que conciliem o desenvolvimento econômico com as demandas ambientais, e uma das soluções propostas pelos estudiosos seria promover a transição da matriz energética atual para fontes de energias limpas. A transição energética, segundo estudos, nos proporcionaria a oportunidade de criar empregos e gerar riqueza, a partir da nova infraestrutura verde exigível para a moderna economia de baixo carbono. Vale dizer que tal modelo está ancorado no desenvolvimento sustentável que pressupõe a inter-relação do tripé: social, econômico e ambiental.

O êxito brasileiro estaria na adoção de um Projeto Nacional de Desenvolvimento Sustentável (PNDS), o qual leve em consideração as dimensões conjunturais e estruturais. Este plano deverá nos conectar a um futuro próximo, no qual os empregos verdes e decentes sejam a tônica da nova realidade que desejamos estabelecer. O PNDS seria uma adaptação, às demandas e peculiaridades brasileiras, do “Green New Deal”, tratado que vem sendo adotado por grandes potências como os EUA, e alguns países da Europa, e reúne propostas para conter a crise econômica e gerar desenvolvimento, sem esquecer de remediar a crise ambiental que o mundo vem enfrentando.

Estudiosos avaliam que, apenas no Brasil, há um potencial de criação de cerca de 2 milhões de novos empregos verdes. A conquista do resultado almejado requer investimentos em educação, com foco em C&T e inovação. Creio, com muito vigor, que seja sim possível conjugar criação de riquezas, equilíbrio ambiental e redução de desigualdade social, resultando numa transição justa e sustentável. Este deverá ser nosso ponto de partida. Para consolidar esse plano é essencial a compreensão e engajamento das novas gerações, nossa esperança se acende quando vemos que uma das maiores lideranças mundiais em defesa do planeta é a jovem Greta Thunberg. Como diria nosso eterno líder Leonel Brizola: “É dos jovens que surgem os grandes movimentos transformadores”.

Vale ressaltar que a superação da emergência climática só ocorrerá quando conseguirmos modificar as bases de nossa relação com a natureza. O processo civilizatório não pode conter em si o risco da extinção do homem e da biodiversidade do planeta, e sim possibilitar um convívio social livre de opressões. Assim, nossa missão não é apenas preservar o planeta. É necessário restabelecermos nossas prioridades, modificando a concepção que temos de nós mesmos e da natureza e reconstruindo as bases de nossa organização socioeconômica. Caso contrário, qualquer esforço no sentido de tentar minimizar ou eliminar os problemas ambientais será apenas paliativo e não representará uma mudança duradoura e sustentável.

*Everton Gomes é cientista político, vice-presidente nacional do Movimento Ecotrabalhismo e secretário nacional de Assuntos Econômicos do PDT.