Mediado por Carlos Lupi, quarto painel encerrou o seminário em homenagem ao centenário do economista brasileiro
“A história de Celso Furtado mostra o momento em que o Brasil percebe seu potencial. Viu o parto de um país moderno. O Keynesianismo tropicalizado.”, afirmou o ex-governador do Ceará, Ciro Gomes, durante o encerramento, nesta terça-feira (7), do seminário online realizado pelo Centro de Memória Trabalhista (CMT), em homenagem ao centenário de nascimento do intelectual paraibano, celebrado no próximo dia 26 de julho. Mediado pelo presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, o quarto painel também contou com a participação do governador do Maranhão, Flávio Dino, e da doutora em economia, Tânia Bacelar.
“Para Furtado, o desenvolvimento não é uma acumulação do tempo ou uma consequência fatalista dos desdobramentos do capitalismo. Ele denuncia que isso é falso. Portanto, estabelece, com clareza, que é necessário que exista Estado e o todo o seu comprometimento”, disse Ciro, ao relatar a amplitude do pensamento visionário apresentado há mais de 60 anos.
Durante a transmissão pelo Youtube do CMT (confira, ao final, na íntegra) e pelas redes sociais da Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini (FLB-AP), Lupi ratificou a representatividade do homenageado ao citar a importância do seu legado na integração do país e a contribuição para o progresso do continente sul-americano.
“Furtado foi um grande brasileiro e patriota que tocava nas feridas da burguesia. Não existe nação sem um projeto feito pela sua gente. Na Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), órgão das Nações Unidas, ele já buscava saídas para poder libertar o povo. Ele não se conformava em ser submisso dentro de um projeto de nação libertário”, comentou, ao completar: “Tinha uma cabeça desenvolvimentista que fazia a defesa dos excluídos e o combate ao preconceito. Ele era uma voz que não se calava diante do opressor”.
Para Tânia Bacelar, Furtado tinha uma ampla atuação e um protagonismo internacional, mas sempre fez questão de nunca abandonar suas raízes nacionalistas. Por isso, segundo ela, seu legado é tão fértil e reverbera com tamanha contemporaneidade.
“Na minha visão, ele era um cidadão do mundo, apesar de não querer tirar o pé do Brasil. Ele sabia a importância do seu país para a América Latina, até como referência”, justificou.
“Ele tinha uma visão multidimensional, passando não só pela economia e o social, mas também pela área ambiental. Ao fazer autocrítica, ele conseguia avançar trabalhando entre as dimensões”, pontuou, dando ênfase à profundidade da sua obra. “Nada mais contemporâneo que a economia criativa. E, naquela época, ele já via potencial nessa área”, indicou.
Consolidando os apontamentos, Flávio Dino celebrou o perfil desenvolvimentista e popular que tinha, de transparecia, um posicionamento nítido de defesa intransigente da população mais humilde.
“Com esse perfil, conseguia quebrar o coronelismo. Sempre militou contra a desigualdade regional. Para nós, nordestinos, excluídos da revolução burguesa do século XX, podemos perceber que o avanço industrial, estimulado por Furtado, representou ganhos para a nossa região”, explicou.
Origens
Ex-ministro da Integração Nacional, Ciro chegou a analisar com Furtado, em 2003, a possibilidade de execução da revitalização da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), autarquia federal que teve o intelectual paraibano como idealizador e primeiro presidente, no governo Juscelino Kubitschek (1956-61). Em 2001, a entidade foi extinta por Fernando Henrique Cardoso.
“O Nordeste tinha problemas de capital humano e de infraestrutura. Tudo o que impedia o sonho modernizante, desde a época de 50, de industrialização. Quando ele faz a Sudene, já projetava um mecanismo de coesão política, pois ali haveria poder real do coletivo. Assim, poderia fazer algumas apostas de transformação”, relatou.
Indicando a representatividade da superintendência após mais de 20 anos de atuação como pesquisadora e economista, Bacelar ratificou que a sua concepção foi uma proposta institucional arrojada.
“A Sudene foi uma ousadia de Celso Furtado. O coração era o seu conselho, a partir da desconcentração via um elo interfederativo. A aposta na política a partir do diálogo do presidente com os governadores para patrocinar um projeto de transformação na região”, explicou.
Em uma exaltação ao sucesso das gestões de Ciro e Dino e do consórcio de governadores, Carlos Lupi assegurou que o sucesso de Furtado traduz a vitória contra o retrocesso.
“Nós temos nele a representação da ascensão social. Ele surge do Nordeste para mostrar sua inteligência para o mundo. Por isso, é simbólico que esta região continue sendo um foco de resistência democrática. Vocês conseguem, com muito sacrifício e luta, estar acima da média nacional”, exaltou.
Um dos indutores da sua formação, Dino aponta, como um destaque, a sensibilidade para permitir um progresso equacionado entre vertentes que precisavam caminhar de forma harmônica.
“Celso pautava a defesa da industrialização, mas também lutava pela reforma agrária para mudança do perfil regional. Arauto do planejamento, buscava planejar para desconcentrar e partilhar com todos. Assim, combateu fortemente a desigualdade social”, disse.
Progresso
Ao exaltar o legado do pensamento desenvolvimentista para a América Latina, Ciro reafirmou a necessidade de um Projeto Nacional de Desenvolvimento (PND) para o Brasil superar a estagnação imposta pelo subdesenvolvimento, estrutura classificada, por Furtado, como historicamente determinada pela evolução do capitalismo.
“Estou recuperando o papel do Brasil forte como defendia Celso Furtado. Faltava projeto ao país. O preconceito se levanta contra todo o patriota. Falar de justiça social e soberania nacional é momento para ser chamado de coronel, por exemplo”, relata.
Para Ciro, a efetiva justiça social, com redistribuição de renda, redução da desigualdade e geração de empregos, passa pelas mudanças estruturais, que contemplam, como elemento central, a alteração do modelo de economia de subsistência a partir da reindustrialização. Este processo demanda, portanto, a parceria estratégica entre os setores estatal e privado para permitir o fortalecimento do mercado interno, a geração de capital nacional, o avanço tecnológico e a redução da dependência sobre a exportação de commodities, de baixo valor agregado.
Bacelar entende que o Nordeste mudou, porém o Brasil se perdeu. Para ela, o país precisa de um projeto de reposicionamento no contexto mundial, pois o formato de país industrial do século XX não é o mesmo do atual.
“O Nordeste hoje é resistência, como vemos no consórcio de governadores, que dialoga com o pensamento de Furtado. Estão, assim, recriando a ideia de região olhando para frente”, celebra.
Ao finalizar, Dino relembrou a preocupação latente de Furtado com o meio ambiente, dentro de uma “visão de desenvolvimento que precisa ser para todos”.
“O seu pensamento continua virtuoso e vigoroso para lutar pelo Nordeste e pelo Brasil. Ao longo da vida, teve a capacidade de agregar perspectivas novas. Uma delas, nas décadas de 80 e 90, é a visão ambiental, ecológica. Virtude de atualização como referência para um novo desenvolvimentismo”, concluiu.