Movimento Negro fortalece manifestações antirracistas e prega união contra retrocessos


Por Bruno Ribeiro/FLB-AP
11/06/2020

O Movimento Negro do PDT promoveu, na última terça-feira (9), um debate virtual com o tema “Manifestações antirracistas: vidas negras importam!”. O encontro, mediado pelo presidente nacional, Ivaldo Paixão, abordou a importância da mobilização da população em prol do combate aos abusos historicamente praticados no Brasil e pelo mundo.

O evento recebeu, como convidados, o deputado federal do PDT, Damião Feliciano, a advogada do movimento pedetista e ex-secretária especial de Promoção da Igualdade Racial do Distrito Federal, Josefina dos Santos, o ex-comandante-geral da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, coronel Ubiratan Ângelo, e a coordenadora do Movimento Negro Unificado em Pernambuco, Marta Almeida.

Ao iniciar sua fala lembrando de lideranças, como Abdias Nascimento – primeiro negro a ocupar o cargo de parlamentar federal -, Ivaldo Paixão, remeteu para a realidade exposta a partir da série de protestos, em todo mundo, que foi desencadeada pela morte por asfixia de George Floyd, nos Estados Unidos, durante abordagem policial. No Brasil, ganhou ainda mais força com os casos do jovem João Pedro, vítima durante ação da Polícia Militar em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, e do menino Miguel Otávio, que perdeu a vida, em um prédio no Recife (PE), pelo descaso da responsável branca, então patroa de sua mãe, empregada doméstica.

“Ceifam vidas no genocídio da população negra. Precisamos falar do desgoverno do Jair Bolsonaro, que estimula a extrema-direita vá para cima dos direitos humanos, onde as minorias estão sendo atropeladas”, comenta, citando a escolha de Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares: “De forma provocativa, ele (Bolsonaro) nomeia um racista de pele negra.”

Josefina dos Santos encaminhou a crítica ao governo federal diante da impossibilidade de acesso aos benefícios sociais, principalmente durante a pandemia do coronavírus, o que gera um impacto na saúde.

“O auxílio emergencial não chega ao nosso povo. Primeiro, a maioria não tem nem CPF, mas só a certidão de nascimento. E ainda é exigido um smartphone, então nem telefone comum serve. Então, como vai conseguir? O governo fez tudo planejado para dificultar”, condenou. “O nosso povo não sabe o que está acontecendo, pois está desassistido. Eles estão correndo atrás de uma cesta básica”, acrescentou.

União

Coautor, na última semana, do pedido para que o Ministério Público Federal (MPF) instaure inquérito para investigar as afirmações de Sérgio Camargo, que classificou o movimento negro de “escória maldita”, o deputado federal do PDT pela Paraíba, Damião Feliciano relatou que “o principal ponto é a união da negritude” para alterar paradigmas sociais.

“Eu sou, até hoje, após seis mandatos, o único deputado federal negro da Paraíba. Na legislatura passada, fizemos a primeira exposição em homenagem aos negros no corredor principal da Câmara”, pontou, ao mostrar a necessidade de rompimentos de barreiras para ampliar, de forma consolidada, a presença em posições de destaque. “Nós precisamos nos erguer para ocupar os espaços na sociedade brasileira. O negro não é só bom para jogar futebol ou dançar samba. E isso passa pelas oportunidades”, completou.

“O Brasil foi o último país a abolir a escravidão. Nessa sequência, o negro foi tirado da senzala e posto na favela. Hoje, temos os bolsões de pobreza nas periferias das cidades, onde estão, justamente, a maioria dos negros”, argumentou, colocando sua intenção de reforçar a construção de políticas públicas a partir do parlamento.

No caminho da integração, Marta Almeida valoriza a necessidade de troca de experiências para fortalecimento em tempos de guerra. Segundo ela, é preciso também criar estratégias de sobrevivência e articulações para “enfrentamento do fascismo, neoliberalismo e capital, que está se alimentando do racismo.”

“O Brasil volta para a pobreza, para o bolsão da insegurança alimentar em meio às crises política e sanitária. E nós, povo preto, pagamos com a nossa vida. Nessa pandemia, a gente observa a limpeza étnica, o negacionismo e o quanto o racismo está latente para alimentar o grande sistema de capital e o genocídio do povo preto”, afirma.

“Cada vez que o capital se reinventa, as formas de racismo também se reinventam. E nós, como militantes pretos e pretas, que somos da luta, precisamos sempre ter esses momentos de articulação política”, acrescenta, relatando a relevância da educação como ferramenta de transformação.

Sobre a importância da representatividade nas eleições municipais, ponderou sobre a necessidade de fortalecer a mobilização pelo impeachment do presidente da República.

“Fazer do ‘Fora Bolsonaro’ nossa bandeira de luta unificada para dizer que a vida negra importa”, disse, correlacionando com a mudança da política externa brasileira e a influência do governo americano no desmonte e sucateamento das ações afirmativas na América Latina.

Segurança pública

No detalhamento das características do brasileiro mais é impactado pela morte violenta, Ubiratan Ângelo lista cinco pontos: homem, jovem, pobre, morador de periferia e negro. Diante dessa realidade, o ex-policial resgata a mudança da ótica do enfrentamento a partir das escolhas possíveis diante da realidade existente.

A partir da sua trajetória como policial, o coronel mostra que o risco sempre esteve presente no seu dia a dia.

“Eu nasci na favela e fiquei até os 22 anos. Aos 18, eu entrei para a polícia, profissão que mais morrem profissionais por morte violenta, e não de doença. Portanto, eu saí do perfil da vítima do homicídio e fui pro profissional. E quando fui para a reserva, percebi que o número de policiais inativos, que morrem desta forma já relatada, é o mesmo dos que estão na ativa.

Lembrando a relevância do coronel Carlos Cerqueira, primeiro comandante-geral da PM no Rio e nomeado por Leonel Brizola durante seu governo, a partir de 1983, Ubiratan também resgatou o progresso da polícia comunitária e da defesa da política de respeito ao morador durante as operações nas favelas.

“A gente tem que repensar a posição de toda a militância negra, porque somos muito bons de fala, mas péssimos de atitudes. Tanto é que a nossa representatividade política, em um país com mais de 60% de negros, não chega a 30%. Há um desequilíbrio, que é consequência da posição e do reconhecimento dos parceiros de luta dentro dos espaços de poder”, finalizou.