Cientista político analisa redesenho eleitoral que levou à vitória de Bolsonaro


Milton Gerson/PDT de
22/07/2019

“A Eleição Disruptiva – Por que Bolsonaro venceu”, nome do livro do cientista político Juliano Corbellini e do economista Maurício Moura, foi o tema tratado pelo Diretório Metropolitano do PDT, em mais uma edição do PDT em Debate, atividade mensal desenvolvida pelo partido para a formação da militância.

O encontro, que foi transmitido, pela primeira vez, ao vivo pelo Facebook, na página do Diretório Metropolitano, contou com a participação de Corbellini, foi coordenado pelo presidente, vereador Mauro Zacher, e teve a presença do líder da bancada municipal, Márcio Bins Ely, representantes das 10 zonais, órgãos de ponta e movimentos orgânicos da sigla na capital gaúcha.

Para Corbellini, o aspecto estrutural da vitória de Bolsonaro foi identificado muito antes de iniciada a corrida eleitoral a partir do que ele e o co-autor do livro convencionaram chamar “Partido da Lava Jato”, fortalecido pelas investigações da força tarefa e cujas conclusões embasaram as acusações do então juiz federal Sergio Moro, tendo como resultado a “controversa” prisão do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, que alavancou um forte sentimento anti-política e o anti-petismo.

O cenário de “terra arrasada da política tradicional”, de acordo com Corbellini, trouxe uma mudança de paradigma no processo eleitoral brasileiro, com a substituição da tradicional polarização entre PT e PSDB, que marcava as eleições presidenciais desde 1994, por dois novos pólos dinâmicos que mediram forças no pleito de 2018: o lulismo e o “partido da Lava Jato”.

O cientista político explicou que, diante dessa situação, quem mais se beneficiou deste cenário “foi, sem dúvida, Jair Messias Bolsonaro” porque o seu discurso “politicamente incorreto e intolerante era tudo o que a massa de indignados queria ouvir, e as redes sociais o veículo perfeito para sua disseminação”, num movimento que classifica como a “memeficação” da política.

Pesquisas

A curva ascendente do candidato do PSL em pesquisas de intenção de voto espontânea, diz Corbellini, já era nítida e consistente desde meados de 2017. “Bolsonaro soube, como nenhum outro candidato, surfar a tsunami gerada pela Lava Jato, que resultou no esvaziamento do centro político, fenômeno semelhante ao que havia sido apontado Wanderley Guilherme dos Santos como um dos fatores para o Golpe de 1964”, disse.

Para Corbellini, no caso de 2018, o enfraquecimento das posições de centro decorreu de fatores exógenos ao sistema político e de representação, que o golpearam “de fora para dentro”: as ações da Lava Jato e a sua espetacularização na mídia em geral. Segundo ele, em 2018 também se observou uma ruptura, “não de caráter institucional como em 1964, mas de radicalização com os padrões de competição eleitoral vigentes desde a década de 1990, e com os atores em função dos quais se organizava”, o que classifica no livro em um capítulo dedicado a “eleição dos indignados”. Corbellini lembra que esse foi o fator para a ruína do PT – e não do lulismo – e do PSDB que sofreu uma espécie de efeito bumerangue da mobilização para a derrubada de Dilma Rousseff.

Para Corbellini, a facada em Bolsonaro não teve papel preponderante na sua vitória, mas potencializou uma posição que já lhe era favorável. Ele ressalta que o monitoramento em tempo real das redes, aliado a outras metodologias da IDEIA Big Data, confirmam essa afirmativa. A base da eleição de Bolsonaro, para Corbellini está na contraposição ao lulismo, que conseguiu angariar parte dos órfãos de Lula.

Esta conclusão, explicou, foi possível graças ao trabalho de um grupo liderado por dois antropólogos que acompanharam 2,5 mil eleitores que declaravam voto no ex-presidente da República. Toda semana, o grupo era incentivado a gravar vídeos sobre a eleição, como pensavam e suas motivações. Houve a identificação de que Bolsonaro ganhava 1/3 dos eleitores do Lula, o que corroborava os dados das outras fontes e dava uma leitura muito privilegiada.

Redes sociais

O poder de mobilização orgânica do bolsonarismo, que, na última semana do primeiro turno, chegou a impactar 40 mil grupos por dia e, possivelmente, 28 milhões de indivíduos, somado ao papel de Olavo de Carvalho, das fake news e da facada como evento propagador do mundo digital foi impactante, segundo Corbellini.

“Em pouco mais de duas horas desde a agressão, o nome de Jair Bolsonaro recebeu mais de 380 mil menções na web, considerado um evento inédito no mundo digital”. O cientista político reconhece que esse processo foi potencializador da imagem de Bolsonaro, que passou a entrar nos noticiários todos os dias e o retirou dos debates, onde poderia sofrer desgastes pelo embate com os demais candidatos.

Para Corbellini, é preciso refletir sobre o rumo das campanhas eleitorais daqui para frente, mas não é certeza de que o “modelo Bolsonaro” seja uma fórmula que poderá levar outros candidatos a triunfos, como um novo paradigma. A perspectiva é a de que a próxima eleição seja, novamente, diferente da que deu a vitória a Bolsonaro.

Segundo ele, a vitória de Bolsonaro carregou consigo uma enorme taxa de renovação no Congresso e a emergência de novas lideranças outsiders, “que foram alavancadas pela articulação entre uma grande mudança tecnológica nas plataformas de comunicação política, que veio para ficar e impactará cada vez mais as campanhas futuras, e uma conjuntura muito específica, que combina a indignação dos eleitores, a ascensão de um mosaico de anti-discursos de natureza conservadora, a desmoralização do sistema partidário tradicional como consequência da Operação Lava Jato e a decorrente perda, por parte da atividade política, que pode ser momentânea. E é difícil imaginar que a política não reencontre um caminho”, afirmou.

Confira a íntegra da palestra, inclusive com a parte das perguntas ao final, neste link.