Os graves incidentes na reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, fizeram ressurgir o debate sobre a soberania nacional e a integridade territorial do país. Diante deste tema estratégico, que merecia tratamento mais equilibrado, alguns se aproveitaram para lançar confusão na sociedade. Até quem não tem qualquer compromisso com a nação e com seu sofrido povo resolveu posar de patriota para justificar a violência contra os indígenas. É o caso do sinistro prefeito de Pacaraima, Paulo Quartieiro, que preside o entreguista Demo (ex-PFL) e armou a sua milícia de jagunços.
O curioso é que nesta mesma semana os EUA anunciaram que irão reativar a sua Quarta Frota na América Latina. Diante desta decisão, que realmente coloca em risco a soberania e a integridade dos países da região, não houve gritaria. A mídia burguesa, sempre tão servil ao império, não deu qualquer destaque à notícia. Poucos foram os autênticos patriotas que levantaram sua voz contra a crescente de militarização na América Latina. Vale destacar a postura revolucionária de Fidel Castro e da nova presidente do Conselho Mundial da Paz (CMP), a brasileira Socorro Gomes.
“Recado à Venezuela e à região”
Nas suas “reflexões” no jornal Granma, o líder cubano lembra que a 4ª Frota de Intervenção dos EUA foi criada em 1943 para combater os submarinos nazistas durante a II Guerra Mundial. Em 1950, foi desativada por ser desnecessária. “Porém, 58 anos depois, ela acaba de renascer e não é preciso esforço para mostrar seus fins intervencionistas. Os próprios chefes militares o divulgam em suas declarações, de forma natural, espontânea e até direta”. O chefe do Comando Sul, James Stavrides, afirmou que o aparato militar ajuda no “mercado de idéias a ganhar corações e mentes das populações da região”. Já o diretor de operações navais, almirante Gary Roughead, informou que o objetivo da 4ª Frota é “combater o terrorismo e as atividades ilícitas no continente”.
Fidel Castro chama a atenção de que o anúncio do retomada da 4ª Frota ocorreu em abril, poucas semanas após a Colômbia invadir o território do Equador, “com armas e tecnologias dos EUA, o que causou profunda repulsa entre os líderes latino-americanos na reunião do Grupo do Rio”. Outra coincidência é que a decisão surge “quando é quase unânime o repúdio à desintegração da Bolívia promovida pelos EUA” e estimulada pelo seu embaixador no país, Philip Goldberg. Para o líder cubano, não há dúvida de que a retomada das operações navais visa intimidar os governos progressistas da América Latina. “É um recado à Venezuela e ao resto da região”.
A “guerra preventiva” de Bush
No mesmo rumo, Socorro Gomes, dirigente do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz) e eleita presidente do CMP, condenou a iniciativa dos EUA. “O anúncio da recriação da Quarta Frota, destinada a realizar missões navais agressivas nas regiões do Caribe, América Central e América do Sul, é uma grave ameaça à paz, à segurança e à soberania dos povos da nossa região. Recentemente, ao respaldar a ação militar da Colômbia em território equatoriano, o governo dos EUA intentou dar vigência no continente aos pressupostos da guerra preventiva, uma doutrina fascista a serviço do terrorismo do Estado”.
“Agora, com o restabelecimento da 4ª Frota, os EUA fomentam a militarização do continente, a corrida armamentista e a ameaça nuclear, já que ela é equipada com porta-aviões nucleares. Tal medida merece nosso mais veemente repúdio. É o que se espera dos governos progressistas, dos movimentos populares e das lideranças patrióticas de toda a região”, afirmou. Socorro também criticou os recentes exercícios navais dos EUA em águas territoriais brasileiras e argentinas, na chamada operação conjunta Unitas. O exercício teve como principal equipamento o porta-aviões George Washington, considerado a maior arma de guerra da atualidade – ele transporta em seus aviões de seis a dez bombas nucleares e torpedos Tomahawks.
“A consciência patriótica não pode aceitar estes exercícios como atos de rotina. O seu caráter é agressivo. Sua existência e realização freqüente aviltam a soberania dos países que servem como cenário das operações. A 4ª Frota como força intervencionista e os exercícios no Atlântico Sul fazem parte da política de guerra do imperialismo ianque, contra a qual se ergue a consciência democrática, independentista e pacifista dos latino-americanos”. No caso dos exercícios navais, a própria Constituição, no seu artigo 21, afirma que “toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional”.
O medo dos “regimes esquerdistas”
O objetivo intervencionista da 4ª Frota e dos exercícios conjuntos, criticado por Fidel Castro e Socorro Gomes e subestimado por alguns patriotas, foi reconhecido pelo próprio jornal Gazeta Mercantil, que faz a cabeça da elite. “Essa decisão chega quando os regimes esquerdistas eleitos pelo voto popular, como o do presidente Hugo Chávez, contestam cada vez mais a influência norte-americana na América Latina e no Caribe. Além disso, os países sul-americanos, entre eles Venezuela, Brasil e Equador, estão aumentando os seus gastos militares”.
A 4ª Frota deverá entrar em operação em 1º de junho. Ela terá sob sua responsabilidade mais de 30 países do continente, cobrindo 15,6 milhões de milhas. O imperialismo ianque tem hoje dez porta-aviões do tipo Nimitz, com capacidade de deslocamento de 101 mil a 104 mil toneladas de carga, incluindo 90 aviões e dois reatores nucleares. O último construído leva o nome de George H.W. Bush, pai do atual presidente-terrorista, e entrará em operação em dois meses. Segundo o Pentágono, os exercícios conjuntos em abril já fazem parte do plano de implantação da 4ª Frota.
Como afirma Fidel Castro, “nenhum país do mundo possui um único navio semelhantes a estes, todos equipados com sofisticadas armas nucleares, que podem se aproximar até poucas milhas de qualquer um dos nossos países. O próximo porta-aviões, o Gerald Ford, terá tecnologia Stealth, invisível aos radares… Os porta-aviões e a bombas nucleares que ameaçam nossos países servem para semear o terror e a morte, mas não para combater o terrorismo. Deveriam servir ainda para envergonhar os cúmplices do império e multiplicar as atividades de solidariedade aos povos”.
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* Diretor de Pesquisas do Cebrapaz, jornalista e autor do livro recém-lançado “Sindicalismo, resistência e alternativas” (Editora Anita Garibaldi).