O Balanço Energético Nacional de 2007 nos indica que, para a geração elétrica no mundo em 2005, foram utilizadas as seguintes fontes: o carvão mineral com participação de 40,3% do total gerado, o gás natural com 19,7%, a energia hidráulica com 16,0%, a nuclear com 15,2%, os derivados de petróleo com 6,6% e outras fontes com 2,2%. Com o preço do barril de petróleo ultrapassando a barreira dos US$ 100 e, obviamente, os preços dos derivados e do gás natural acompanhando essa escalada, somado ao fato da ameaça do efeito estufa em decorrência da queima dos hidrocarbonetos e do carvão, a humanidade enfrenta o desafio da busca de fontes geradoras de eletricidade mais limpas e competitivas. Alguns aproveitamentos hidráulicos causam fortes impactos ambientais, que proíbem seu uso, e muitas das fontes alternativas ainda não foram suficientemente desenvolvidas, como a solar, de forma que ainda fornecem eletricidade a preço proibitivo.
As necessidades de mais curto prazo estão a impor caminhos já conhecidos e a energia nuclear desponta sempre como forte candidata. Nesse contexto, os programas nucleares existentes no mundo começam a serem revisados, inclusive impondo-se a antecipação da construção de novas usinas. Como decorrência, prevê-se um crescimento considerável do consumo de urânio, em futuro próximo, com a acelerada valorização desse estratégico energético.Com o término da guerra fria, por volta de 1990, estoques de urânio destinados, inicialmente, para fins militares, foram ofertados em torno de US$ 10 por libra de urânio (U3O8), no mercado de geração elétrica, tanto pelos Estados Unidos como pela Rússia. Quando os estoques militares mostraram sinais de esgotamento, a libra de urânio atingiu US$ 130 em 2007, estando atualmente em torno dos US$ 95.
O Brasil, além de possuir 309.000 toneladas de reservas de urânio conhecidas, através da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), domina a tecnologia do enriquecimento, que agrega enorme valor ao produto, caso seja decida a exportação. O enriquecimento, em escala industrial, é realizado na INB, que também fabrica, depois do urânio ser enriquecido, os elementos combustíveis, significando mais agregação de valor ao produto final. Nossa capacitação tecnológica e industrial no setor nuclear precisa ser levada em consideração pelos órgãos federais e pelos congressistas, nesse momento em que algumas mineradoras, inclusive estrangeiras, demonstram a intenção de produzir urânio para exportá-lo na forma mais primária (U3O8).
Aceitar esse tipo de concessão significará o cerceamento das conquistas da tecnologia nacional, com a conseqüente limitação dos benefícios para toda a sociedade, permitindo que tais mineradoras abasteçam unidades de enriquecimento no exterior, para manter programas nucleares de países que não têm urânio, como França, Inglaterra, Japão, Alemanha, China e Índia. O lobby das mineradoras junto ao Executivo e ao Legislativo é enorme, pois, para poderem atuar nesse setor, é necessário que o monopólio estatal do urânio seja extinto, sabendo-se que, para tal, um deputado já apresentou proposta de emenda à Constituição, a PEC 171.
A demanda por fontes de energia tem motivado guerras e tragédias sociais em várias regiões do globo, causando a denominada geopolítica do petróleo, presente nos planos e ações das grandes potências industriais e militares. A exaustão dos hidrocarbonetos, a agressão ao meio ambiente pela queima dos combustíveis fósseis e o irreversível crescimento de muitas nações emergentes, exigindo maior suprimento de energia, levará, em futuro muito próximo, à aparição da geopolítica do urânio. Para esse cenário de forte e disputada demanda por energéticos geradores de eletricidade, impõe-se preservar nossas reservas de urânio como monopólio “inflexível” do Estado, bem como expandir e aperfeiçoar as preciosas conquistas da engenharia e da técnica nacional, no domínio do combustível nuclear.
Sergio Ferolla, brigadeiro, membro da Academia Nacional de Engenharia e Paulo Metri, conselheiro do Clube de Engenharia