Ao participar, hoje (8), de audiência pública realizada pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, da Câmara dos Deputados, especialistas lamentaram que o país não tenha conseguido reverter a falsa ideia de que o ingresso precoce no mercado de trabalho é uma forma de superar as dificuldades familiares ou evitar que jovens pobres sejam aliciados por criminosos. Argumentos que, para os especialistas, ajudam a sustentar o círculo vicioso de “gerações de segregados” e que só serão superados com políticas públicas que garantam educação de qualidade e trabalho e remuneração digna às famílias.
A assessora da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria Izabel da Silva, afirmou que parte da população ainda desconhece as leis que proíbem o emprego da mão de obra infantil e as consequências de tal prática. A Constituição federal proíbe a contratação de menores de 16 anos (salvo na condição de menor aprendiz, a partir de 14 anos) e veda a presença de menores de 18 anos em ambientes perigosos ou insalubres, incluindo o trabalho noturno.
Maria Izabel sugeriu que estados e municípios desenvolvam seus próprios planos de prevenção e erradicação do trabalho infantil, semelhantes aos realizados em âmbito nacional. Ela também destacou a necessidade de que seja criado um sistema nacional de informações sobre o problema, mencionou a importância de programas e políticas públicas que garantam o ingresso e a manutenção dos responsáveis familiares no trabalho e de uma escola pública de qualidade, em período integral e atraente. Por último, recomendou que os agentes de saúde sejam capacitados para identificar crianças vítimas do trabalho infantil que eventualmente encontrem em suas visitas domiciliares.
A procuradora do Trabalho Valesca de Morais do Monte acrescentou que é necessário mais verbas para o combate ao trabalho infantil e compete ao Poder Público implementar e exigir o cumprimento das leis existentes.
“Já temos boas leis. Podemos aprimorá-las, mas, a meu ver, o mais importante é cumprir as que já existem. Exigir que isso seja feito por cada ente público é uma das prioridades do Ministério Público”, disse a procuradora, mencionando gerações de crianças mutiladas no trabalho em canaviais pernambucanos ou que perderam a infância e a saúde em carvoarias mineiras.
Citando o trabalho infantil como uma das formas mais perversas de exploração dos direitos humanos, por comprometer a formação intelectual, psicológica e física das crianças, a diretora da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), juíza Sandra Miguel Abou Assali, criticou propostas parlamentares de reduzir a idade mínima para o ingresso no mercado de trabalho.
“Seria um retrocesso às conquistas nacionais e uma vergonha. Quem começa a trabalhar cedo não tem acesso à educação mínima, que é o que garante a cidadania e a inserção social. No futuro, esta criança se torna um adulto mais vulnerável a ser explorado e, ao constituir sua própria família, [tende a] transferir aos seus filhos a ideia equivocada [das vantagens] do ingresso precoce no mercado de trabalho”.
Autor da proposta de realização da audiência, o deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP) garante que todas as sugestões e informações coletadas serão discutidas com maior profundidade durante um seminário previsto para o final do mês, quando a comissão planeja elaborar um projeto para aprimorar as leis e iniciativas governamentais que visam eliminar todas as formas de trabalho humilhantes.
Agência Brasil