Ciro na PUC-SP: Impeachment é contra os pobres


OM - Ascom PDT / OM /TV PUC - SP

O ex-ministro e ex-governador Ciro Gomes, em palestra nesta quinta (28/4) na PUC de São Paulo, criticou a campanha da mídia para derrubar a presidente Dilma, chamou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mais uma vez,  de “gângster”; e falou de sua possível candidatura à presidência em 2018 pelo PDT. Na opinião de Ciro, é fundamental uma renovação da esquerda brasileira.

“O que está acontecendo [o processo de impeachment] é basicamente um assalto aos interesses da população mais pobre”, afirmou em entrevista ao jornalista Ivan Longo da revista Forum.  Crítico ao governo Dilma Rousseff, mas opositor ferrenho do processo de impeachment, o ex-governador do Ceará alertou sobre a necessidade de renovação da esquerda brasileira e de um “mea culpa” do PT.

“Não acho razoável que o PT não faça pelo menos um mea culpa e não ceda a oportunidade a outros quadros. Não precisa ser eu, mas é preciso renovar a política brasileira”, disse Ciro, pré-candidato à presidência em 2018 pelo PDT.

Segundo Ciro, sua pré-candidatura se dá, justamente, pela “ameaça” que passa a democracia brasileira.

“Eu aceitei a convocação do meu partido para assumir uma pré-candidatura por que nós consideramos que, neste momento, a democracia brasileira está sendo violentada, está sendo ameaçada na sua sanidade. Que a gente se organize, que a gente organize movimentos de opinião, referências, de gente que tenha algo a dar para a população. E eu tenho uma experiência e não me sinto autorizado a faltar ao Brasil nem ao nosso povo nesse momento”, explicou o ex-ministro que em 2002 apoiou Lula no segundo turno das eleições.

Para Ciro, a esquerda brasileira saberá, sim, se renovar, pois seus valores são “universais e perenes” e sempre haverá  “o imperativo moral para superar as desigualdades, a violência, o desamor e a infelicidade consumista”, que, segundo ele, são componentes que colocam o Brasil em uma tragédia coletiva.

“Especialmente com componentes caricatos, se não trágicos, como vimos no parlamento presidido por um gângster”, completou.

Ciente do alto risco que existe do Senado aprovar o impeachment de Dilma, Ciro acredita, contudo, em um milagre para barrar o afastamento que, segundo ele, viria da mobilização popular porque, frisou, “o que está acontecendo é um assalto aos interesses da população mais pobre”.

Ele acrescentou:

“Estou lutando para que esse tragédia [o impeachment] não aconteça. Evidentemente sou vivido, sou experiente, sei qual é a probabilidade hoje, mas acho que é possível que aconteça um milagre, e esse milagre é a mobilização popular. O povão, nosso povo mais pobre, não sabe ainda a tragédia que o ameaça. E se a gente conseguir, mesmo perfurando a interdição da grande mídia, conseguir que nosso povo acorde, e perceba que o que está acontecendo é basicamente um assalto aos interesses da população mais pobre, e esse povo vier para rua e cercar o Senado, quem sabe esse milagre não aconteça”.

Na palestra na Pontifícia Universidade Católica (PUC) Ciro fez diagnósticos sobre a crise política e alternativas para o desenvolvimento brasileiro.  Veja os principais pontos da palestra e, depois, se quiser, o vídeo com a íntegra do debate.

 

 

Ciro Gomes: “Só um milagre vai nos salvar dessa ruptura democrática”

Para o ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco e ex-ministro de Integração Nacional, só a mobilização popular pode impedir o impeachment da presidenta Dilma Rousseff

Por Manuela Azenha

Para Ciro Gomes, uma tragédia se aproxima do Brasil. Segundo o ex-ministro da Fazenda de Itamar Franco e ex-ministro de Integração Nacional de Luiz Inácio Lula da Silva, só um milagre será capaz de evitar uma ruptura democrática no País – e esse milagre passaria pela mobilização popular nas ruas contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

Em evento na PUC-SP nessa quinta-feira, Ciro disse que um eventual governo Temer será um desastre: “Imagine os graves problemas brasileiros agora manejados por um usurpador sócio em toda a ladroeira que Eduardo Cunha representa e com concepções econômicas hostis aos interesses das populações mais pobres”.

Atuação do Senado e do STF

“Eu não me movo por crenças. Qualquer pessoa que tem uma percepção minimamente realista não tem muita animação com a possibilidade do Senado e o Supremo interromperem esse itinerário de tragédia para o qual está caminhando nosso País. Entretanto, como não sou um neutro observador, o que acho necessário é uma militância. Só um milagre vai nos salvar dessa ruptura democrática e esse milagre está na mão da sociedade brasileira, que não se conectou ainda. A massa popular não se conectou porque considera o governo muito ruim e não tem refletido sobre o que será o governo Temer. Se ela fizesse isso, e a grande imprensa brasileira sabe disso, certamente iria para a rua. É sempre uma possibilidade. Temos de lutar por isso.”

Governo Temer

“Eu sei categoricamente da tragédia que se aproxima. Esse movimento de tirar a Dilma construiu uma grande maioria no povo brasileiro – não é consenso, mas é uma grande maioria. Ele tem três blocos de razões que só se reúnem na negação do governo Dilma. O primeiro bloco é o eleitor frustrado do Aécio Neves, que considera que a eleição foi uma fraude de marketing e considera que a eleição foi tomada deles por enganação – não sem um certa dose de razão. O segundo bloco de frustração, que é onde estou, por exemplo, é o testemunho dessa tragédia econômica que representa o manejo do governo Dilma. E o terceiro bloco é a novelização do escândalo de corrupção, ladroeira, e o moralismo passional em cima de uma sociedade muito sofrida. Na medida em que o impeachment acontecer, esses três blocos serão traídos a uma só vez. E ai você imagina o desastre que será os graves problemas brasileiros sendo manejados por um usurpador sócio em toda a ladroeira que Eduardo Cunha representa e com concepções econômicas hostis aos interesses das populações mais pobres.

Ponte para o futuro

Aquilo é uma réplica malfeita de um ideário que está desmoralizado desde a crise de 2008. O problema brasileiro, do ponto de vista fiscal, tem duas despesas fora do quadro. Só duas. Se você olhar todas as outras, o gasto por cabeça com saúde, educação, defesa, qualquer um, todos estão aquém dos padrões internacionais  para um país do nosso tamanho. O que está fora do padrão é um gasto previdenciário dos grandes, políticos, promotores, juízes, e de uma demografia que está envelhecendo com certa velocidade. Não há nenhuma palavra nesse pseudodocumento sobre isso. E o segundo gasto fora do previsto é o com serviço da dívida. O Brasil está consolidando uma taxa bruta de investimento federal de 0,65% do PIB, por ano, e está gastando com juros 12,5% do PIB. Não há nenhuma menção a isso nesse documento. Depois tem coisas que podem até ser consideradas, num contexto de ampla discussão com a população, como a vinculação de gastos com saúde e educação, mas com um governo constituído pela usurpação e pelo golpe? Preservando o privilégio das classes mais ricas e pedindo ao povo mais sacrifício? Nenhuma chance. É uma tragédia que está se aproximando.

Esquerda partidária

A esquerda partidária brasileira, vamos falar com clareza, o PT, tem que fazer um mea-culpa. Afinal de contas, essa tragédia foi semeada pelo Lula, o grande responsável por ter colocado essa quadrilha na linha de sucessão do País. E fazer um mea-culpa em direção ao conjunto da população. Nós avançamos muito pouco em matéria de organização da nossa população. O modelo de poder do PT sempre dependeu de um líder carismático, pai das massas, contra o qual eu sempre me posicionei. Se a gente não organizar o povo, logo em seguida vem pra cima da gente as nossas falhas.

Novas eleições gerais

É uma proposta muito charmosa em tempos de golpe. Uma ‘marinice’, uma ideia vã e simpática. Mas eu sou obrigado, pela minha prática, experiência e respeito à opinião pública, a não apoiar esse tipo de mistificação. Para passar uma eleição geral, teria que, em tese, votar uma emenda constitucional. E teria que ser aprovada por 3/5 da Câmara Federal, presidida por Eduardo Cunha, 3/5 do Senado Federal, presidido por Renan Calheiros, em duas turmas de votação em cada uma das casas. Depois disso qualquer governador, prefeito, partido político, senador, deputado poderia arguir junto ao STF, com grande probabilidade, que essa emenda constitucional, fere direito adquirido.  E nossa Constituição traz a cláusula pétrea de não retroagir para ferir direitos adquiridos. Então repare: é muito charmoso, não deixa de ser interessante a gente discutir o assunto, até para tirar a máscara e ver o Michel Temer dizer que eleição direta é golpe, mas é uma bobagem.

Ataque aos pobres

A população brasileira, principalmente os mais pobres, é quem mais perde com a crise. Faz um ano que ninguém dedica um dia de serviço à agenda popular. Desde que a Dilma se elegeu começou essa interdição, o planejamento e a consumação, agora bastante avançada, desse golpe de Estado, e toda agenda da população está posta de lado. Inclusive por erro do governo. Quantas vezes eu disse à presidenta Dilma que ela deveria propor pautas populares, nem que fosse para ser derrotada. Essas coisas, na democracia, não são neutras. A gente às vezes ganha perdendo. Fazer agenda reacionária, acabar sendo afastada pelos reacionários e ver a democracia brasileira ser destruída é uma coisa muito inocente do ponto de vista da Dilma.

Operação Lava Jato

A Lava Jato e o juiz Sergio Moro podem prestar um grande serviço nesse momento, em um País como o nosso, cansado da impunidade, da corrupção. A minha geração comemora a Lava Jato e a conduta do juiz Sergio Moro. Isto dito, é preciso que a gente desconfie muito da novelização de uma ação judicante. A justiça boa é a justiça serena, sóbria, severa, que abre mão dos holofotes, das homenagens, das gravatas borboletas.

Foram vários erros cometidos por Moro. Um juiz conduzir coercitivamente um indivíduo que não se negou a prestar qualquer tipo de esclarecimento. Um juiz divulgar conversas grampeadas ilegalmente, interferindo no processo político e, pior do que isso, um juiz aceitar a ronda vaidosa, humana. Tudo o que ele errar agora significa impunidade no futuro. Basta lembrar da Operação Satiagraha, toda ela foi anulada. Não prestamos atenção, a imprensa sumiu e os grandes bandidos, marginais de alto coturno que estavam ligados estão todos passeando frivolamente.

Votação do impeachment na Câmara

Precisamos dar valor ao voto para deputado federal. O presidencialismo obriga que o Executivo negocie com o parlamento eleito. O despotismo esclarecido é que imagina que gente pode ter um governo à parte, aceticamente protegido da imundície do parlamento. É possível, mas não sem grandes tensões e conflitos, demarcar o campo de até onde você negocia. E nisso o PT errou gravemente, o Lula especialmente. Dilma quis, tardiamente, estabelecer esse limite e deu a confusão que deu, a desconstituição de sua autoridade institucional. Me deu vontade de chorar vendo aquela sessão, pensando na amargura que é nosso povo vendo aquilo.

Erros de Dilma

Dilma jamais poderia ter assumido o governo em antagonismo com o que ela falou e pregou nas eleições. Ela abandonou toda a agenda, desconstituiu sinais de legitimação com grupos sociais que lhe deram a vitória e nomeou o Joaquim Levy como ministro da Fazenda. Isso tudo para dar um sinal a uma tal fantasmagórica entidade que não vota, que é o mercado. Quando ela nomeia o Levy, ele produz uma agenda que é estúpida do ponto de vista técnico. Diante de um problema fiscal no Brasil, ele aumenta gravemente a maior despesa corrente, que é o juro, e faz deprimir dramaticamente o nível de arrecadação da receita pública pela depressão econômica que estamos vivendo. Ou seja, produziu o oposto do que a retórica reacionária conservadora anuncia na necessidade de um ajuste de austeridade fiscal.

Mídia

Parte importante da mídia nacional, que é de São Paulo e do Rio de Janeiro, e é composta por cinco famílias, está no golpe. É parte orgânica e central do golpe. A questão é simples de avaliar: o impeachment é um processo jurídico e político. Juridicamente, a nossa lei é imperfeita. Ao contrário do direito positivo, que caracteriza o direito penal, a lei de crime de responsabilidade não tem clareza na tipificação do que é crime e fica nas difusas arbitragens. É flagrante que Dilma não cometeu, e muito menos dolosamente, nenhum ato criminoso. E o processo que está correndo fala em pedalada fiscal, que tecnicamente é um truque praticado, absolutamente errado, mas que não caracteriza crime, muito menos de responsabilidade. A emissão de decretos de suplementação foram praticados por seis governadores, inclusive pelo Geraldo Alckmin e pelo relator do impeachment, Antonio Anastasia, quando era governador de Minas Gerais e o Tribunal de Contas da União nunca censurou. Portanto, não tem o que discutir: não há base jurídica para esse impeachment. É um assalto golpista, de base parlamentar, e por um parlamento controlado por uma quadrilha de ladrões.

PMDB/PSDB

Eu faço distinção entre os dois partidos. No PMDB há boas pessoas, Pedro Simon, Jarbas Vasconcellos, pessoas com quem eu não concordo, mas que eu respeito, o Roberto Requião. A hegemonia do PMDB, de muitos anos para cá, é de uma quadrilha, são bandidos, ladrões, pura e simplesmente salteadores do dinheiro público. Esse é o grande câncer que o País está vivendo, porque eles são gigantescos, sob ponto de vista do poder que têm, e nulos sob ponto de vista da responsabilidade  diante da sociedade. Todo governo que se rende ao presidencialismo de coalizão, que é a mistificação que o Fernando Henrique inventou para nobilitar a falta de pudor e ética, vira isso. O Romero Jucá vai ser agora, se o impeachment passar, a figura mais importante do governo Temer. Foi líder do governo Dilma, Lula, FHC. E ele é processado pelo STF por corrupção. Os presidentes da Câmara e do Senado também e são todos do PMDB. O PSDB é um problema à parte, ele não é uma média de ladrões. Jamais imaginei o Aécio Neves envolvido em corrupção, não faz parte da minha convicção, até o dia em que faça. Mas eles estão fazendo um papel imundo, de coadjuvantes dos quadrilheiros do PMDB. E eles serão os grandes responsabilizados pela história.

Retrocessos

A esquerda será derrotada gravemente. E não é só a esquerda, é todo mundo decente, idealista, que imagina um país menos selvagem, menos bruto e violento. Vocês não tem ideia do que vem aí de agenda contra os modestíssimos avanços contra uma sociedade machista e homofóbica. O que está por trás disso é uma agenda neopentecostal, de retrocessos, de políticas sociais não universais.

Agressões

Ao cuspir em Jair Bolsonaro, Jean Wyllys fez o que qualquer homem ou mulher deve fazer quando lhe é ferida a dignidade. Claro que a aristocracia brasileira não concorda comigo, mas eu sou assim. Hoje eu não tenho mandato nenhum. Quando eu tenho, eu me comporto. Mas sem mandato como estou, se agredido ou insultado, vou reagir, e não sei se será com cuspe.

Pós-golpe

Depois do golpe vem a rebordosa, a ressaca. A elite brasileira, essa plutocracia, é tão calhorda que  vai dar a cabeça do Eduardo Cunha. E ai fico torcendo para ele fazer uma delação premiada, será a maior da história da humanidade. Leva todos os picaretas que ele comprou na Câmara, e o vice Michel Temer, que é sócio dele em todos os malfeitos.

 

Veja a íntegra do vídeo do debate